2018 foi mais um bom ano para a música portuguesa, com vários projetos nacionais a surgirem e mostrarem o seu talento.
Aqui ficam, por ordem alfabética, os novos nomes da música portuguesa que mais nos surpreenderam e mais potencial demonstraram ter. São artistas que devem dar que falar no futuro, mas que merecem ser ouvidos desde já.
Vindos da região portuguesa com a reputação de menor entropia, os COMPADRES, colectivo composto pelos DJs/turntablists Dj Sims, Fatinch e Mr. Mendez mostram que o Alentejo não esteve parado. Ao longo de sete temas, tiram o pó ao soul, arrastam o funk do armário dos vinis e numa nova roupagem de hip-hop assentam COMPRADES, EP de estreia auto-intitulado. Este compacto de sons orgânicos foi feito para o Movimento Alentejo Unido, uma plataforma cooperativa de união, promoção e organização de cultura urbana alentejana, mas não só.
Oriundos de Aveiro e com o rock como segunda natureza, os Cosmic Mass emergem com doses substanciais de psicadélia a rasgar, por via de, segundo os próprios, “riffs pesados e melodias hipnotizantes”. Para além das influências que partem tanto da golden age do rock psicadélico (Jimi Hendrix, Led Zeppelin, Cream), como da “nova” guarda (Queens of the Stone Age, King Gizzard and The Lizard Wizard), os membros da banda também possuem uma destreza instrumental que resulta em trips sonoras igualmente alucinantes e cativantes, e uma química significativa entre os mesmos. O álbum de estreia, Vice Blooms, está mesmo aí à porta.
Formados em 2015, os portuenses FERE são um coletivo que conta com Jaime Manso (baixo), João Pedro Amorim (guitarra), Pedro Alves (baixo) e José Pedro Alves (bateria) nas suas fileiras, nomes já conhecidos da cena nacional de post-rock. Em 2016, o grupo foi convidado pelo Teatro Experimental do Porto a compor a banda sonora da peça de teatro Nunca Mates o Mandarim tendo sido interpretada ao vivo durante as apresentações da peça no Teatro Nacional São João. No ano passado, a banda estreou-se finalmente ao vivo, apresentando composições baseadas no post-rock mas com momentos mais pesados que se aproximam da sonoridade de grupos como Isis ou Sumac e já em 2018 editaram o seu primeiro álbum, Montedor, com o selo da Raging Planet.
HRNS é o duo composto por Afonso Arrepia Ferreira (FARWARMTH) e Rui P. Andrade, dois jovens músicos e produtores que exploram a beleza insustentável do drone, presente nas suas composições frias e lascivas carregadas de emoção. Aquando de um encontro em Lisboa e de uma atuação no EKA Palace, os dois produtores juntaram esforços para a elaboração de um novo projeto, sendo After the Angels o resultado dessa junção. Composto por três faixas originais, o EP de estreia foi editado pela britânica ACR, que editou também os mais recentes trabalhos de Rui P. Andrade e FARWARMTH.
O techno está a ganhar mais vida e os Judas Triste, banda sediada no Porto e fundada por David Machado, Dora Vieira e Nuno Oliveira, anunciam ao planeta uma nova era de escuridão embevecida pelos experimentalismos eletrónicos que lhe dão origem. Os Judas Triste estreiam-se nas edições com o novo disco homónimo, na casa Favela Discos e é entre descargas explosivas de distorção, atmosferas misteriosas e um ambiente áspero e fortemente inspirado na improvisação que o trio apresenta um disco coerente e conciso, claramente a demarcá-los como uma das bandas revelação do ano. Num total de seis canções que espelham o seu metatechno profético, os Judas Triste registam as suas incursões às profundezas da imaginação e todo este disco funciona como uma viagem explorativa ao seu mundo singular.
Killian resulta da união de Diogo Sanches e Bruno Gonçalves. Este é um dos projetos da Troublemaker Records, editora que aposta no melhor R&B contemporâneo e nacional. Em 2017 estiveram presentes no Festival Termómetro, mas foi em 2018 que o falatório se intensificou com várias atuações na capital. Foi prometido ainda este ano o lançamento do seu álbum de estreia, Flawed Ego, no entanto apenas nos chegaram aos ouvidos os singles “Good Habits” e “Let Me In”, onde é um notória uma excelente produção, deixando-nos certamente com água na boca para mais novidades.
Para os bons conhecedores de música nacional, Mathilda já não é um nome estranho. O projeto a que cantautora vimaranense Mafalda Costa dá a cara editou no final do ano passado o seu primeiro single, “Lost Between Self Expression and Self Destruction”, mas foi em 2018 que embarcou numa série de aventuras pelo nosso país, encantando tudo e todos com a sua voz doce e suave, em atuações de cariz bem intimista (nós que o digamos no ZigurFest). Ora com ukulele ora com guitarra elétrica, consegue aquecer corações com as suas canções de filigrana e veludo, onde retrata e suporta as fragilidades de uma artista bastante madura, mas que ainda só tem 18 anos.
O quarteto que se divide entre Lisboa e Beja é formado por Afonso Serro (teclas), Vicente Booth (guitarra), João Spencer (baixo) e João Romão (bateria). Influenciados pelos valores de BADBADNOTGOOD, Kamasi Washington, J Dilla, Yussef Kamaal, Bruno Pernadas, entre outros, editaram em maio o seu EP de estreia homónimo, composto por cinco canções instrumentais deveras orelhudas e pegajosas onde fundem o hip-hop com o jazz. É sempre bom ver que há espaço para o jazz de fusão continuar a evoluir no nosso país, como também são exemplo os Bruma.
Os Melquiades são uma banda de rock experimental lisboeta formados por António Agostinho (guitarra), Diogo Sousa (bateria), Luís Lucena (baixo) e João Nascimento (sintetizadores). O quarteto, que adota ritmos e harmonias latinas na sua sonoridade, diz-se influenciado por Bruno Pernadas, Mars Volta e até pelos seus desenhos animados de infância favoritos. Compostos por membros dos Moullinex e QuartoQuarto, os Melquiades são capazes de criar sons particularmente únicos. Editaram em setembro o seu EP de estreia, Oyster Eggs, onde os trocadilhos, desenhos animados e boa onda se misturam e invadem tanto os nomes das músicas como o nome do próprio EP.
A Troublemaker Records continua a dar cartas, e a Killian junta-se NESS. Alter ego que nasceu nas ruas de Sintra, NESS conta-nos a sua perspectiva sobre o que é viver num mundo onde desde pequena teve que aprender a definição de auto-reflexão, independência e perdão. NESS apresentou em 2018 o seu primeiro single, “Karma”, de influências R&B, soul e eletrónica, afirmando a sua inquietação lírica e graciosidade pela melodia. Já com várias músicas produzidas (como se poder ver na setlist de um concerto que a artista deu no Musicbox em julho), espera-se ansiosamente pelo seu EP de estreia, MESS.
ORLA é o primeiro trabalho a solo de João Pedro Amorim (FERE, Memoirs of a Secret Empire). Mass trata-se de uma viagem cíclica e exploratória pelo universo vizinho, de onde se vê a orla daquele em que julgamos estar. Entre o uso ocasional de instrumentos como o trompete e a guitarra eléctrica, os sintetizadores representam o espaço, ao mesmo tempo que o ocupam e a massa aumenta. Já o tempo, por si só não existe, logo a viagem nunca acaba.
Tomás Frazer é um produtor lisboeta conhecido no mundo da música sob o moniker de Oströl. Com raízes no classicismo, foi pianista e conviveu com a música de Bach, Mozart e Schubert, algo que não o impediu de apostar em sonoridades eletrónica de ritmos mais hipnóticos e densos. Editou em fevereiro o seu álbum de estreia Austral Sounds, pela lisboeta Rotten Fresh, onde é bem audível o uso recorrente de samples, texturas sintéticas e atmosféricas, intercaladas com momentos mais dançáveis, havendo ainda algum espaço para sons de cariz oriental envolvidos em negrume (oiça-se a faixa que título).
O Álbum Desconhecido de P. ADRIX junta-se ao longo catálogo da Princípe Discos de estreias absolutamente avassaladoras. Por entre os ritmos de batida, com um forte ênfase em síncopes reminescentes de DJ NIGGA FOX e uma certa densidade psicológica que DJ FIRMEZA trouxe com Alma Do Meu Pai, P. ADRIX navega habilmente como um conjurador de ritmos de dança aparentemente desconectados. Nascido em Lisboa e com ascendência angolana, encontrou casa em Manchester há 3 anos, algo que se faz sentir ao longo de Álbum Desconhecido – ora ubíquos, ora distantes, ritmos da club scene britânica intrometem-se no pós-kuduro do produtor lisboeta. Neste registo, batida angolana é produzida sublimemente e encharcada de grime e jungle, transportando o ouvinte para a selva urbana de P. ADRIX
António M. Silva apresenta-se ao mundo como Sal Grosso e editou em outubro o seu álbum de estreia através da recém-fundada combustão lenta records. Gravado em casa do próprio durante o inverno de 2017 e o verão de 2018, Lets all just go wild and put our hands in the air a bit é o resultado humilde de uma série de ensaios improvisados com teclados obsoletos, máquinas ruidosas e vários pedais e processadores de efeitos. No seu primeiro registo de longa-duração, o produtor propõe um trabalho criterioso de música sonhadora e desacelerada que vive nos (e dos) territórios comuns ao ambient, noise e minimalismo.
Caracterizam-se como jazz-punk pós-aquático e são formados pelo poeta António Pedro Ribeiro (voz) , Sérgio Rocha (guitarra), João Pires (bateria), Nils Meisel (sintetizadores) e Tommy Luther (baixo). Vêm do Porto com as suas músicas longas movidas a noise rock e no wave irregular. No meio de todo este caos cacofónico, António Pedro Ribeiro declama ferozmente os seus poemas, sendo acompanhado nas performances ao vivo por Kenneth Stitt, homem de speedo que dança livremente com os seus longos braços e pernas, vociferando por vezes algo indecifrável ao microfone.
Simão Simões lançou pela Rotten Fresh o álbum strel, onde apresenta uma sonoridade marcada pela IDM e pelo Glitch. É um disco constantemente interessante, onde sons são cortados, repetidos e manipulados de forma a criar ritmos complexos e dinâmicos em conjunto com ambientes sonoros atmosféricos. Há momentos relaxantes, outros dançáveis e outros que pedem toda a nossa atenção para apreciar a sobreposição e mistura de várias texturas. Não faltam também boas melodias e samples, assim como sons sintetizados que nos puxam para o mundo digital criado pelo artista de Setúbal. strel está entre o melhor da música eletrónica portuguesa.
Nihilus é o disco de estreia de Bruno Costa sob o moniker Spiralist, editado em maio pelo selo Microfome. Criado tanto como uma reação à morte de projetos musicais e bandas anteriores, como devido à necessidade de materializar a sua visão artística, Nihilus conta a história de um personagem sem nome que é gradualmente corrompido pela entidade epónima do álbum, a nível físico, psicológico e até mesmo moral, num conto metafórico que espelha os efeitos da depressão em si. Para fãs do black-metal e de elementos da música doom, hardcore-punk e ambient.
Os Terebentina, sexteto com base no Porto, têm vindo a agitar o cenário independente da Invicta com algumas das performances mais abrasivas que nos recordamos de assistir nos últimos tempos, delineando os limites da experimentação com um som que tem tanto de refrescante como de familiar. Influenciados pela corrente exploratória e subversiva da América dos anos 1970, de Glenn Branca a DNA, os Terebentina apresentam um conjunto portentoso de canções de difícil categorização, uma exploração expressiva e visceral que só sente o conforto na vertigem.
Em 2007, o harpista Eduardo Raon, a pianista Joana Sá e o violoncelista Luís André Ferreira criaram um ensemble de música improvisada que dá pelo nome de Powertrio. Agora em 2018 foi a vez de Luís José Martins, na guitarra clássica, e Nuno Aroso, percussionista, se juntarem a este trio e formarem o coletivo Turbamulta. Estes cinco músicos são responsáveis por uma sonoridade clássica contemporânea e minimalista, e editaram em março o seu disco de estreia homónimo, com o selo da Clean Feed. Neste último podemos encontrar melodias oníricas e delicadas, texturas enigmáticas e articuladas, tudo com base no improviso.
vau é o projeto onde Nuno Craveiro revela uma faceta completamente oposta à do seu outro projeto Névoa, com seis composições ambiente/drone cuidadosamente trabalhadas durante os últimos quatro anos. ways of stilness é o seu primeiro lançamento a solo e um disco bastante pessoal, atingindo o seu objetivo de imergir o ouvinte num espaço de tranquilidade onde o tempo parece ter abrandado através, especialmente, dos inúmeros field recordings utilizados. ways of stilness foi editado no passado mês de novembro pela britânica Whitelabrecs.