Os Melhores Álbuns de 2024

Os Melhores Álbuns de 2024

| Janeiro 20, 2025 6:10 pm

Os Melhores Álbuns de 2024

| Janeiro 20, 2025 6:10 pm

Porque o que é “nosso” em nada deve ao que nos chega lá de fora, este ano a Threshold optou por reunir sob o mesmo domínio os melhores lançamentos de artistas nacionais e internacionais — sem dissociar idioma de geografia. Em 2024 fomos igualmente surpreendidos pelas tapeçarias eletroaústicas de Rafael Toral, imperial no ato contínuo de Spectral Evolution, e de Nala Sinephro, a consolidar uma vez mais o seu lugar no campo grande do jazz ambiental. Rendemo-nos aos lamentos de Maria Reis e de Adrienne Lenker, recuperamos o folgo com a jarda musculada dos Chat Pile, malhamos ao som das barras de Joey Valance & Brae (sempre com o verde brat na camisola). Não esquecemos o regresso em forma dos Cure, 18 anos depois de 4:13 Dream, o canto do cisne dos Shellac ou os caminhos desbravados por Nídia & Valentina. Fomos maravilhados pela música inclassificável de Cindy Lee, Chanel Beads, funcionário e HHY & The Macumbas. E vamos continuar a sê-lo.

20. Fat Dog – WOOF

19. Shellac – To All Trains

18. 800 Gondomar – São Gunão

17. HHY & The Macumbas – Bom Sangue Mau

16. Adrianne Lenker – Sadness as a Gift

15. Funcionário – Momento Claro

14. Nídia & Valentina – Estradas

13. Geordie Greep – The New Sound

12. Chanel Beads – Your Day Will Come

11. The Cure – Songs of a Lost World

10. Maria Reis – Suspiro…

9. Magdalena Bay – Imaginal Disk

8. Cindy Lee – Diamond Jubilee

7. Joey Valance & Brae – NO HANDS

6. Chat Pile – Cool World

5. MJ Lenderman – Manning Fireworks

A trajetória de M(ark) J(acob) Lenderman enquanto músico em nome próprio tem sido ascendente desde 2017, ano no qual gravou um álbum em que ouvimos, pela primeira vez, o cunho do seu alter ego MJ Lenderman. Desde logo nesse registo evidenciaram-se as texturas sonoras tributárias do alt-country e da (ocasional) deriva no slowcore — pense-se nos primeiros avanços de grupos como Sparklehorse, Silver Jews ou Acetone — que se vieram reproduzir um pouco por todos os seus álbuns posteriores e também em Manning Fireworks, o seu sexto longa-duração, lançado no ano de 2024. Mas se em álbuns anteriores a presença da secção rítmica era mais notável dado à sua (maior) aproximação às estéticas do rock, o destaque das composições que neste LP emergem de instrumentos como o violino, o piano e a guitarra havaiana vai para MJ Lenderman e a sua ardil escrita. Mais do que a sua performance como vocalista, é na cosmologia do seu universo lírico repleto de personagens (homens, maioritariamente) deprimidos, por ele retratados com autocomiseração e ironia, que encontramos os objetos da nossa devoção a Manning Fireworks. E chegados ao final deste disco, ficam as sensações de homenagem a músicos como Townes Van Zandt, Jason Molina ou David Berman — referências q.b. óbvias nos seus arranjos — e de que a voz de MJ Lenderman alcança aqui patamares mais altos (por lá ficará, esperamos) enquanto letrista. Edu Silva

4. Nala Sinephro – Endlessness

No instante em que tudo começa, somos abraçados por uma sensação de serenidade. O saxofone suave de James Mollison (Ezra Collective) entrelaça-se com as sequências pulsantes dos sintetizadores, enquanto a bateria de Morgan Simpson (antigo baterista dos Black Midi) oscila entre acelerações e pausas, movendo-se numa cadência própria, distinta da eletrónica. É com “Continuum 1” que Nala Sinephro inicia Endlessness. Dividido em 10 partes, cada uma intitulada “Continuum” e devidamente numerada, o segundo registo de estúdio da compositora belga-caribenha, atualmente a viver em Londres, sucede Space 1.8, disco de estreia editado em 2021 também pela mão da Warp Records. Centrado num arpejo que se estende ao longo de 45 minutos, Endlessness encontra em Alice Coltrane um terreno comum, apesar da distância de décadas, e ombreia com clássicos do jazz. Minunciosamente elaborado, é sustendado por elementos meditativos e orquestrações suaves, que transitam entre o jazz espiritual e o space ambient. Além de Mollison e Simpson, Endlessness reúne uma série de amigos da cena jazz de Londres, incluindo Nubya Garcia, Sheila Maurice-Grey (líder da banda Kokorok), Natcyet Wakili, entre outros. Momentos como “Continuum 3”, onde a harpa de Sinephro sobresai, revelam o lado noturno de Endlessnes, imergindo-nos num limbo onde a fronteira entre o sono e o sonho se dissolve. Somando-se a essas qualidades oníricas, Endlessness é também um disco com propriedades curativas e catárticas, que nos inspira a respirar fundo e a querer experenciar a vida em toda a sua amplitude. Essa essência foi vivida no memorável concerto nos jardins da Gulbenkian, em Lisboa. Rui Gameiro

3. Rafael Toral – Spectral Evolution

Enamorado pelos standards intemporais de George Gershwin e Duke Ellington, que distorce a seu bel-prazer, Rafael Toral apresenta em Spectral Evolution um ato contínuo de exploração e liberdade. São 47 minutos de deriva e beleza desarmante, construídos a partir de um desejo incessante de transformar o familiar em algo inteiramente novo. É isso que faz no seu último álbum, onde reacende o clarão dos primeiros discos, gravados maioritariamente à guitarra. À estimada Fender Jaguar – a mesma que ilumina discos como Sound Mind Sound Body (1994) e Violence of Discovery and Calm of Acceptance (2001), que marcam o princípio e o fim de uma cultuada fase ambiental – junta-se um sem fim de instrumentos e dispositivos modificados, incluindo um amplificador de bolso e um gerador de ruído branco controlado por theremin. A música expansiva dos primórdios, de um lado, e o laboratório de hipóteses levantadas com o Space Program, do outro, matizados na visão singular do músico lisboeta. Filipe Costa

2. Charli XCX – BRAT

Brat. Simultaneamente palavra do ano em 2024, segundo o Collins Dictionary, e álbum do ano, embora não contemple o primeiro lugar na tabela da Threshold Magazine. Foram precisos dez anos para Charli XCX ver o seu talento reconhecido enquanto cantora, compositora, produtora e DJ, e fê-lo com o seu oitavo longa-duração. Escrito como se de mensagens para amigos se tratasse e com a premissa de que cada canção pudesse ser ouvida numa rave, Charli XCX levou muito a sério a missão de criar um disco repleto de “Club Classics”. Vulnerável, como já tinha sido no álbum pandémico How I’m Feeling Now, Charli reflete sobre as próprias inseguranças nas relações pessoais enquanto mulher na indústria musical e ainda presta homenagem a SOPHIE, artista multidisciplinar e sua amiga. Sensual e arrebatador, foi um trabalho capaz de transcender barreiras culturais e geracionais, marcando o ano de 2024. Brat não é apenas um álbum, mas um fenómeno do qual tivemos a sorte de poder testemunhar. Catarina Fernandes

1. Mount Eerie – Night Palace

O ilustre cantautor e timoneiro da banda de culto The Microphones, Phil Elverum, lançou um novo álbum com o seu projeto mais badalado, Mount Eerie, de seu nome Night Palace. O álbum duplo, o mais longo sob esta designação, tem como tema central o ato de seguir em frente depois de uma tragédia não só por si próprio, mas pelos seus entes queridos, mensagem essa que é enfatizada pela presença subtil de uma influência terapêutica que marcou Phil ao longo dos anos: meditação Zen. Essa narrativa é realçada pela atmosfera geral do disco, que é marcada por uma constante experimentação levada a cabo por Phil ao longo das músicas: as faixas em si podem ser mais folky, ou mais dadas aos drones e ao noise, ou até mesmo algo de intermédio – que envolve a certo ponto gravações de motivos naturais e alguns gritos gélidos que não destoariam de um álbum de black metal. O ouvinte é assim levado para uma jornada que passa por momentos de turbulência e de dor, para assim chegar ao fecho da experiência de Night Palace por via de um clímax catártico. Arrepiante. Ruben Leite