Reportagem: Reverence Valada 2016 – 9 de setembro

Reportagem: Reverence Valada 2016 – 9 de setembro

| Setembro 21, 2016 5:33 pm

Reportagem: Reverence Valada 2016 – 9 de setembro

| Setembro 21, 2016 5:33 pm

Depois de um suado aquecimento ainda havia muitas mais calorias para queimar e o segundo dia prometia uma correria diabólica caso os fãs pretendessem ver todas as bandas que queriam. Se o primeiro dia nos trouxe uma enchente de bandas de garage rock, então este segunda dia mostrava uma maior presença de psicadelismos no seu cartaz. O ambiente continuava calmo, como tem sido a imagem de marca do Reverence Valada, mas era possível observar uma maior enchente de pessoas.


The Black Wizards

Os feiticeiros e feiticeiras que marcaram presença em dois concertos no Sonic Blast voltam a subir a um palco indicado para o seu talento e género musical. Pela terceira vez este ano tive o prazer de ouvir a banda a apresentar o seu disco de estreia, Lake of Fire, e todas as vezes soa a algo novo e especial.  É um prazer poder afirmar que vivo na mesma geração que estes músicos.

O blues esteve no ponto e o stoner não se fez rogado. A Joana Brito fez a sua função de encantadora de cobras e hipnotizou toda a audiência. É de notar os problemas técnicos que assombraram o baixo e o impediram de fazer barulho durante algum tempo, um problema que não assombrou a performance no seu geral. O destaque do concerto vai para o solo de bateria da Helena Peixoto. É incrível vê-la no seu disfarce de John Bonham e a deixar todos na audiência de boca aberta.


Miss Lava

Outra banda que também marcou presença em Moledo, Miss Lava subiu ao palco Indiegente perante uma audiência que deixava algo a desejar em termos de número.  Sem se deixar desmoralizar por este percalço, a banda fez o que melhor sabe fazer e deu um concerto de rock puro e bruto, apesar de quando começaram o baixista ainda estar na casa de banho. Não, isto não é uma cena do filme Spinal Tap, aconteceu mesmo.

Estes continuam a apresentar o seu novo disco Sonic Debris, em que músicas como “The Silent Ghost of Doom” e “Another Beast is Born” funcionam muito bem ao vivo. Também não foram esquecidas faixas mais antigas como “Ride” e “Red Supergiant”.


LSD and the Search for God

Para quem não conhece, LSD and the Search for God é uma banda de shoegaze criada em 2005 e que nunca lançou nenhum álbum. Ao contrário de bandas como My Bloody Valentine ou Slowdive, que viram a sua reputação crescer para bandas de culto, estes continuam a ser uma banda relativamente obscura. Pode não querer dizer nada, mas estes ainda tocaram o seu set à luz do dia. Contudo esta banda pode gabar-se de possuir uma fan base fiel e dedicada, tanto assim que o concerto ainda não tinha começado e já existiam algumas pessoas a guardar lugar para poder ver o concerto na frontline.

O concerto foi uma experiência onde pudemos comprovar que todos os membros da banda sabem o que estão a fazer. É incrível como estes se conseguem mover no meio do caos das distorções e das paredes de som. Sem dúvida um dos destaques do festival e uma mais valia no cartaz.




Yawning Man

O deserto de Califórnia passou por Valada e varreu tudo à sua frente. Yawning Man, banda que com orgulho pode afirmar-se como uma das pioneiras do movimento desert rock, veio com um novo álbum debaixo do braço, Historical Graffiti, e foram recebidos de braços abertos.

A mistura de estilos que vão desde o blues, ao rock psicadélico e o experimental compuseram os 45 minutos que a banda esteve em cima de palco. O concerto foi em grande parte instrumental, à excepção da última música, e funcionou com base no contraste das partes melódicas e das partes mais agressivas. Em grande parte, o público aderiu e acompanhou as músicas com um headbang geral.

Este concerto serve para comprovar uma das melhores características que o Reverence tem para oferecer, visto que criam oportunidades únicas e vão buscar bandas de culto e experientes que, em ocasiões normais, um português não teria oportunidade de ver.


Fat White Family

A noite começava a cair e um dos concertos mais icónicos da edição 2016 começava a avizinhar-se. As luzes apagam-se e seis jovens britânicos sobem ao palco. São os Fat White Family e quem não conhecia o nome deles passou a conhecer.

Lias Kaci Saoudi, vocalista da banda, foi o ultimo a entrar em palco para dar voz à “Whitest Boy on the Beach”. A música ia a meio já estava este sem t-shirt, a suar e a dar voz a todo o ódio que escorre no seu corpo. É impossível não tecer comparações com Iggy Pop dado o seu comportamento anarquista e as danças esquizofrénicas em cima de palco. Sem exageros, estamos perante um dos maiores personagens da geração musical moderna.

Durante o concerto foi possível ouvir grande parte das músicas tanto de Champagne Holocaust, primeiro álbum da banda, como do mais recente Songs for Our Mother. Músicas como “Hits, Hits, Hits”, “Auto Neutron”, “Cream of the Young” e “I am Mark E Smith” serviram para encher os ouvidos dos festivaleiros.

Certamente, um concerto que vai marcar o festival de Valada e para mais tarde relembrar. Os Fat White Family podem não ser a banda mais talentosa do mundo mas são sem dúvida capazes de dar um dos concertos mais inesquecíveis da atualidade. Cheers à melhor pior banda do mundo.


Dead Meadow

Depois da tempestade que foi Fat White Family o que poderia vir a seguir? A resposta é: algo completamente diferente.

Com a maior das simplicidades e com poucos diálogos, os Dead Meadow subiram ao palco e fizeram o que melhor sabem fazer: música. Sem nenhum álbum novo na calha, o alinhamento foi feito essencialmente das melhores músicas da banda “Sleepy Silver Door”, “1000 Dreams” encheram o coração de quem esteve a ver este concerto. No final da interpretação de “Me and the Devil Blues”, tocada com uma frieza e uma mestria que apenas estes homens conseguem e com o seu característico tom na guitarra e no baixo, apercebi-me que estava num dos melhores concertos do festival.

O momento mais alto do concerto foi quando tocaram “What Needs Must Be”, a emotiva letra combinada com a melodiosa guitarra e com aquele solo arrebatador desarmaram-me por completo.


The Brian Jonestown Massacre

Na previsão do festival eu tinha apostado que este ia ser não só um dos melhores concertos do ano como também o melhor concerto do ano. Não estava errado. A sensação de ver os sete membros a subir ao palco e a pegar nos instrumentos é algo indescritível.

A hora e meia em que estiveram a tocar podia ter durado até ao final da noite porque, mesmo assim, ninguém iria sair inteiramente satisfeito deste concerto. Existiam demasiadas músicas de demasiados álbuns que podiam ter sido tocadas e apenas a hora e meia de concerto não chegava. Grande parte da setlist consistiu em músicas mais recentes, incluindo “Fingertips” do novo álbum que ainda vai sair este ano. Ficou a sensação que a banda podia ter tocado algumas músicas mais antigas, contudo, quem se juntou ao coro de “Who” e quem ouviu os acordes mágicos de “Anemone” sabe o quanto valeu o concerto.

Se os músicos que constituem a banda são uns autênticos extraterrestres que estão ligados uns aos outros para fazer música transcendente, existe um membro que serve de elo de ligação entre os simples seres humanos do público com os extraterrestres que estão em cima do palco. E esse homem chama-se Joel Gion. A maneira relaxada e descontraída como toca pandeireta numa das mais importantes bandas de psych rock moderno. A arte de ver um concerto de BJM divide-se em duas partes. Primeiro é o estado transe onde apreciamos as músicas de olhos fechados e a segunda parte é aquela em que apreciamos as peripécias do Joel em cima de palco. Apesar de um lançamento de pandeireta mal calculado que resultou no derrube do microfone do Anton (ato que provavelmente há 20 anos atrás teria resultado numa pancadaria geral e no abandono do concerto) foi um deslize menor que faz parte da aventura do que é ver um concerto destes homens.

Agora passamos ao mestre. Anton Newcombe é o responsável (à parte do Nick Allport) por termos estado dia 9 de setembro em Valada a ver o que foi um dos concertos mais marcantes que passaram em Portugal nos últimos anos. Mas não foi só a teimosia e a persistência de Anton que carregou a banda durante os anos que o levou a atingir este estatuto. A confiança que este senhor tem em si próprio e a postura de que é o Homem mais fixe do mundo faz dele o líder da banda mais fixe do mundo.




A Place to Bury Strangers

Depois da descarga emocional que foi BJM chegou a hora de ver APTBS. Cheguei um bocado atrasado e a tentar furar a multidão para conseguir ver o que se passava no palco, mas qual foi surpresa minha quando vi que só estava o guitarrista no palco.

Enquanto continuava na minha tarefa de tentar conseguir um vislumbre do palco reparei que estava uma concentração de pessoas ao lado da mesa de som. Aproximei-me e tive a segunda surpresa do concerto. O baterista e o baixista estavam os dois no meio do público a fazer uma jam.


 A banda que mistura shoegaze e post-punk focou-se essencialmente nos álbuns Exploding Head (2009) e Worship (2012), tendo tocado malhas como “I Lived My Life to Stand in the Shadow of Your Heart” ou mesmo “Ego Death”, para completo delírio dos fãs. Como já é habitual, guitarras foram destruídas. Apesar de não ser a minha praia devo dizer que foi uma boa surpresa e um prazer ter saído do concerto com os ouvidos quase a sangrar.


Ozric Tentacles

Abandonar este concerto foi das maiores facadas no meu coração. Ter começado tão tarde e acabar de madrugada era demasiado para o meu corpo e por isso tive que abandonar o campo de batalha.

Da meia hora que vi, assisti a uns bons solos de guitarra e umas malhas incríveis de rock progressivo, mas nada comparado ao grandioso concerto que apenas acabou às 6 da manhã. 

Fica para outra oportunidade (ou talvez não.)



Dia 2 @ Reverence Valada




Texto: Hugo Geada
Fotografia: Filipa Casas
FacebookTwitter