Reportagem: Iceage + Terebentina [Hard Club, Porto]
Reportagem: Iceage + Terebentina [Hard Club, Porto]
Novembro 1, 2018 10:16 pm
| Reportagem: Iceage + Terebentina [Hard Club, Porto]
Novembro 1, 2018 10:16 pm
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Foi no passado dia 26 de outubro, sexta-feira, que regressámos ao Hard Club para mais um evento com selo At The Rollercoaster. Noite concorrida já que, no mesmo espaço, se encontravam dois dos atos mais fundamentais da Matador moderna. De um lado, na sala 1, encontrava-se Kurt Vile, o cantautor natural da Pensilvânia que subiu ao norte para o último de dois concertos em Portugal (três se contarmos o showcase no Chiado). Do outro, na sala 2, encontravam-se os dinamarqueses Iceage, que regressaram a Portugal para os primeiros concertos em nome próprio.
Com novo disco na bagagem, a banda de Elias Bender Rønnenfelt encontra-se em plena forma e maturidade, com elogiosas críticas por parte dos meios de comunicação especializados a apontar Beyondless, o título do disco em questão, como o melhor dos rapazes dinamarqueses. A opinião é divisiva e discutível, claro, mas já não restam grandes dúvidas que encontrámos nos Iceage uma das bandas mais consistentes e promissoras dos últimos dez anos. No ano em que a banda comemora precisamente uma década de existência, dirigimo-nos então à sala menor do Hard Club, onde atuou também o coletivo portuense Terebentina.
Perante uma sala menos composta que o expectável (o sucesso do concerto ao lado poderá ter influenciado), os Iceage apresentaram-se impávidos e com a indiferença que lhes é caraterística, iniciando o serão ao som de “Hurrah”, o tema de abertura de Beyondless que introduziu a performance em compasso frenético. “Pain Killer” seguiu-se nesse mesmo ritmo alucinante, apoiando-se em linhas embriagadas de saxofone e violino e uma letra tão orelhuda quanto arriscada. Ainda em mote de apresentação do novo álbum, seguem-se as texturas sombrias de “Under The Sun” e “Plead The Filth”, primeiro em toada gótica, quase neofolk, depois em devaneios lascivos de humor apurado. “Lord’s Favourite One”, o único tema de Plowing into the Field of Love a integrar o alinhamento, desencadeou um dos momentos mais acesos da noite, com alguns membros da plateia a celebrarem o tema do saudoso disco de 2014 com moche e agitação q.b.. E se o tema transacto convidou o ambiente de rodeo, “Thieves Like Us” prosseguiu com mais uma boa dose de agitação, onde a influência (ainda que subtil) do cancioneiro tradicional norte-americano, do country à americana, se cruza com a boémia poética e sonhadora dos dinamarqueses.
Já na meta final, ouve-se “Take It All” e o tema-título do quarto álbum, cuja languidão contida e arrastada marca o compasso final de um capítulo, dando início a uma breve retrospetiva que percorreu os primórdios impetuosos de New Brigade e You’re Nothing. A marcha militar e industrial de “White Rune” serviu de mote para este regresso à frieza de espírito juvenil, seguindo-se o caos punk de “Ecstasy” e o manifesto utópico de “Morals”, intercaladas apenas pelo último de dois temas inéditos a figurar o alinhamento. As paisagens ácidas e áridas de “Catch It” fizeram o deleite dos presentes, que pareciam pintar o tema como o novo ex-libris do grupo, encerrando uma noite de emoções à flor da pele.
Menos crus e viscerais que na última passagem por Portugal, a banda dinamarquesa apresenta-se, no entanto, mais confiante e aprimorada, o charme continua no ponto e o carisma de Elias mantém-se inigualável. O romantismo a que nos habituaram ao longo dos últimos quatro anos poderá deixar-nos saudosos das performances incendiárias e apaixonantes de outrora, mas o veredicto final é o de uma banda amadurecida que não se contenta com conformismos, que abraça os princípios do bom rock n’ roll sem nunca cair em clichês bacocos.
Antes, os Terebentina encarregaram-se de aquecer a noite com a comoção e intensidade merecidas. O sexteto sediado no Porto tem vindo a agitar o cenário independente da Invicta com algumas das performances mais abrasivas que nos recordamos de assistir nos últimos tempos, delineando os limites da experimentação com um som que tem tanto de refrescante como de familiar. Influenciados pela corrente exploratória e subversiva da América dos anos 1970, de Glenn Branca a DNA, os Terebentina apresentaram um conjunto portentoso de canções de difícil categorização, uma exploração expressiva e visceral que só sente o conforto na vertigem.
Texto: Filipe Costa
Fotografia: Helena Granjo
Texto: Filipe Costa
Fotografia: Helena Granjo