8.4/10
Björk não nos é um nome desconhecido; todos nós já ouvimos e conhecemos, querendo ou não, o eterno e intemporal “It’s Oh So Quiet”, single eternizado em Post (1995). Esta artista sempre foi marcada pela sua excentricidade musical e vanguardismo sonoro, uma artista que, nunca cessando, mantinha-se fiel a nunca fazer algo igual ao que tinha feito anteriormente, numa constante reinvenção do que ao que chamamos música experimental e electrónica e nunca esquecendo as suas bases pop. Fez álbuns que, para mim, são considerados os pilares de muitos artistas existirem como a tão aclamada FKA Twigs que provavelmente deve ter passado algum tempo a ouvir álbuns como Homogenic (1997) e Medúlla (2004). Nunca foi mentira para ninguém que Björk sempre foi A mulher para mim. Ela é a única mulher que interessa no que se pode falar de música experimental e electrónica, tendo ela revolucionado muito da indústria, mantendo-se sempre fiel à sua pequena produtora inglesa One Little Indian. Não só faz arte musicalmente como também visualmente sendo ela co-produtora de vários dos seus videoclips e arquitecta também de todo o conceito por de trás de Biophilia (2011), a experiência visual da pura simbiose entre música e a Natureza.
Para vos ser sincero, anseio pelo Vulnicura desde que Björk, por motivos pessoais, teve que cancelar o seu concerto no Optimus Primavera Sound em 2012. Todos os anos em diante pensava quando é que ela iria decidir movimentar-se um pouco e dar vestígios de vida e até que a meados de 2014 esta senhora foi homenageada no Museum of Modern Art (MoMa) em Nova Iorque pela sua personalidade artística multifacetada, prestigiando o seu trabalho de mais de 20 anos, onde, no catálogo da exibição, davam dicas do que ver melhor na galeria em relação aos trabalhos expostos. Mas havia algo que não batia certo ou que, por alguma razão, ninguém percebia por completo. Uma pauta escrita especificamente para órgão com o nome Black Lake. Claro como fã, isto foi um espasmo de alegria porque aquele mísero pedaço de papel com algumas notas e letras sentidas significavam que uma nova era estava para vir e a era Biophilia estava finalmente para fechar por completo. Aquilo foi o início de Vulnicura para o público. Entretanto, já em 2015, muito repentinamente, Björk posta nas suas redes sociais que estaria a trabalhar num novo álbum desde 2012 com os artistas Arca (produtor de Yeezus de Kanye West e LP1 de FKA Twigs e também muito falado em 2014 pelo seu álbum de estreia, Xen) e The Haxan Cloak (um dos repercussores da música dark ambient e drone em 2013), dando também a conhecer a tracklist para o álbum e que a data de lançamento estava agendada para Março. No entanto, poucos dias depois do recado (infelizmente ou não), Vulnicura vazou pela Internet e, encurralada a um canto, Björk decidiu disponibilizar o álbum para compra em formato digital.
Como era de esperar, para ouvir o tão esperado álbum da islandesa, é necessário que pensem que estão a ouvir a artista pela primeira vez porque se tentarem associar um trabalho novo a um antigo acabam sempre em pontos de interrogação. Vulnicura é um álbum de sentimentalismo cru e sem dó, baseia-se no fim e na tentativa da reconstrução da relação amorosa que Björk tinha com o artista Matthew Barney por mais de 12 anos debruçando-se, claro, no conceito de família.
Apaixonei-me por completo pelo álbum desde a primeira vez que o ouvi sentindo-me completamente maravilhado por “Black Lake” (o mais provável single). Todo este álbum é carregado por uma atmosfera melancólica e de sofrimento, mas esta música é o epíteto de dor; não só é a mais longa do álbum com 10 minutos mas é a que mais nos transmite um aspecto de fragilidade em que a artista se encontra, com arranjos de cordas cuidadosamente pensados e batidas subtis deixando as suas palavras quase que flutuarem no “lago negro” da sua alma e dando-nos a sensação de afogamento ao longo da música. A seguir desta deparamo-nos com “Family”, um grito de raiva pela morte sua família, um luto sentido com um som muito à la Haxan Cloak, muito mais sombria que qualquer outra música no álbum, parando a meio para uma mudança drástica de melodia depois retomando-a novamente mas nunca deixando calar as palavras “So where do I go to make an offering to mourn our miraculous triangle: Father, mother, child” acabando com arranjos mágicos típicos do genial co-produtor Alejandro Ghersi. Se tivesse que escolher uma faixa favorita do álbum teria que apontar para “Mouth Mantra” que em suma explora o silêncio que a cantora manteve face à situação amorosa com sintetizadores bem marcados e barulhentos e arranjos de cordas que estão bem presentes no álbum. Mas é claro que não se deve esquecer a balada “Quicksand” que é quase a fénix do álbum. Nesta última música a artista pega em objectos como o black lake e usa-o para dizer que apesar de negro ainda sustém vida e dali nascerá algo novo repetindo como refrão “When I’m broken I am whole and when I’m whole I’m broken” elevando-o para o “nós”.
Agora se acho que as músicas poderiam ter sido menores? Não, provavelmente não teriam tido o mesmo impacto que têm mas, muito resumidamente, Vulnicura é um álbum muito diferente do que qualquer outra coisa que a artista tinha feito até agora, a imersão emocional nunca tinha sido tão profunda como esta mas não era para mais, nunca tivera razão para tal e para além disso do que é que estávamos à espera? É a Björk!
Texto: Júlio de Lucena