O Festival Vilar de Mouros regressou em 2016 depois da sua falhada edição de 2014 e ausência em 2015. Regressou com um cartaz excelente que fez as delícias dos amantes da música dos anos 80 com artistas como The Waterboys, OMD, Peter Murphy e Happy Mondays.
25 de agosto
Após montar as tendas e arrumar a bagagem dirigimo-nos para o palco principal onde estava quase a iniciar o concerto do eterno baixista dos Joy Division, Peter Hook, que juntamente com a sua banda, The Light, nos ia presentear com uma hora de alguns dos maiores êxitos de Joy Division e New Order. Sem perder tempo começaram com “Digital”, a primeira faixa de Unknown Pleasures, um dos mais importantes álbuns de post-punk, que se encontrava muito bem representado por grande parte de público que envergava, orgulhosamente, t-shirts com a capa do mesmo.
Era fácil de perceber que a maior parte do público queria ouvir, principalmente, músicas de Joy Division, a qualidade dos músicos impossibilitou a indiferença, os fãs da extinta banda deliravam, muitos dançavam qual Ian Curtis, os “não fãs” tiveram a sua oportunidade de perceber o sentimento que as músicas transmitem e descobrir a sua genialidade num concerto que, apesar de ter sido apenas às 20h, tinha qualidade para ser o ultimo desse dia. Após “Transmission”, foi o momento de reviver os clássicos de New Order que apesar de muito mais dançáveis e divertidos que os temas anteriores, infelizmente, não foram tocados com a mesma qualidade. Nesta parte do concerto “Blue Monday” era a música mais desejada nesta altura e eis que chega, sempre perfeita, na sua versão de cerca de 5 minutos. Antes de terminar o concerto, Peter Hook, decidiu dedicar a última música aos seus amigos, que tocariam umas horas depois, os Happy Mondays, fechando, assim, com “Love Will Tear Us Apart” e, no fim deste tema, atirou, como já é costume, a sua camisola para o público. Um concerto que dificilmente será esquecido por quem o presenciou que tem como única falha a falta de “Disorder”.
Setlist
Digital
Isolation
She’s Lost Control
Shadowplay
Transmission
The Perfect Kiss
Blue Monday
True Faith
Temptation
Ceremony
Love Will Tear Us Apart
O céu já estava completamente escuro quando Paulo Furtado, ou The Legendary Tigerman, subiu ao palco com “Gona Shoot My Woman” do seu já antigo Naked Blues iniciando, assim, uma hora de puro Rock’n’Roll. Um concerto divertido, como seria de esperar, que, devido à sua curta duração, se focou nas músicas mais mexidas deixando, naturalmente e infelizmente, “Do Come Home” de lado. Deste concerto destaca-se “These Boots Are Made For Walking” que Tigerman fez questão de referir que a música escrita por Lee Hazlewood foi gravada pela primeira vez por Nancy Sinatra e que para a sua versão da música (contida no álbum Femina) escolheu Maria de Medeiros para o acompanhar. “Naked Blues” e “Storm Over Paradise” foram também boas escolhas no alinhamento. Para terminar o concerto e como já é costume foi escolhida “Twenty First Century Rock’n’Roll” onde Paulo Furtado se despediu com “Esta é a última música de Rock’n’Roll que vão ouvir esta noite”. ROCK’N’ROLL.
Sempre dentro dos horários vimos Rowetta a subir ao palco juntamente com Gary Whelan, Mark Day e Paul Ryder para uma introdução à qual se juntou posteriormente Shaun Ryder e Bez culminando em “Kinky Afro”, uma das mais conhecidas canções de Happy Mondays, divertida e rápida como seria de esperar com Bez a espantar os menos preparados para um concerto com um tocador de maracas/dançarino em palco. Logo a seguir Shaun perguntou ao público “Do you know 24 hour party people? Plastic face can’t smile the white out?[letra da música]” começando, imediatamente, “24 Hour Party People”. Seguiu-se um concerto monótono e uma aula de história da banda quando Shaun, antes de cada música decidia fazer uma introdução dizendo o ano da mesma (sendo isto totalmente inútil pois todas as músicas pertenciam a Pills ‘n’ Thrills and Bellyaches). Felizmente, Bez entrando e saindo de palco quebrava alguma da monotonia e quando Rowetta se juntava, ocasionamente, criava, também momentos diferentes. Com o álbum praticamente todo tocado a banda saiu de palco para um regresso imediato num encore(?) onde foram tocadas “Hallelujah” e “Wrote For Luck(WFL)”. Um concerto que numa opinião imparcial seria considerado aborrecido de uma banda histórica que tem, assim, o seu regresso a Portugal passados bastantes anos.
Depois de um intervalo enorme e ainda cerca de vinte minutos de atraso surgiu Peter Murphy, com o seu olhar penetrante e assustador. Abriu com “The Rose” começando, assim, mais um dos melhores concertos do festival. Como pouco conhecedor do trabalho do líder dos Bauhaus, “Eliza” foi a canção que mais me surpreendeu, nunca a tinha ouvido em estúdio. Após esta enorme canção do disco Lion, Murphy, decidiu fazer um pequeno tributo a Bowie com “The Bewlay Brothers”, um dos mais lindíssimos temas de Hunky Dory. Seguiu-se um momento mais dedicado aos fãs de Bauhaus com “Silent Hedges” e “The Passion Of Lovers”. “A Strange Kind Of Love” foi o momento mais comovente de todo o concerto onde toda a aura sinistra de Peter Murphy foi facilmente ignorada em prol da sua voz. “Dark Entries”, também de Bauhaus, foi a canção escolhida para terminar o concerto e despediu-se dizendo regressar em outubro. Na setlist ainda estava como encore “All We Ever Wanted Was Everything” (e “Loctiane”) cuja falta foi bastante sentida, assim como a falta do clássico tema “Indigo Eyes” e ainda, para alguns, “She’s In Parties” e “Bela Lugosi’s Dead”, num concerto de cerca de uma hora que, apesar de excelente, soube a pouco.
Setlist
The Rose
Hang Up
God Is An Alcove
Disappearing
Eliza
The Bewlay Brothers
Silent Hedges
The Passion Of Lovers
Subway
A Strange Kind Of Love
Cuts You Up
The Prince & Old Lady Shade
Dark Entries
26 de agosto
O segundo dia iniciou com Neev, o artista com a carreira mais curta nesta edição do Vilar de Mouros, ainda não tendo editado um disco de estreia. Apesar de não conhecer as suas canções o público do festival pareceu aderir bem às suas músicas, sendo as partes apenas instrumentais bem melhores que as partes com vocais. Os Linda Martini trouxeram o seu disco Sirumba ao Vilar de Mouros, assim como alguns temas já clássicos como “Juventude Sónica” e “Dá-me A Tua Melhor Faca”. Num concerto de cerca de 50 minutos foram capazes de surpreender os incautos e manter o nível de qualidade a que os fãs estão habituados.
Setlist
Dá-me A Tua Melhor Faca
Sirumba
Unicórnio de Santa Engrácia
Juventudo Sónica
Amor Combate
O dia em que a música morreu
Volta
Panteão
Belarmino vs
Putos Bons
Cerca de uma hora e meia depois regressamos ao palco principal para presenciar o regresso do Echo & The Bunnymen depois da sua passagem pelo Vodafone Paredes de Coura em 2013. Sempre pontual, a banda de Ian McCulloch, começa o concerto com “Going Up”, um dos melhores temas de Crocodiles, o primeiro álbum da banda. Continuando a viagem por Crocodiles, a banda decide visitar um pouco de The Doors com um medley que incluiu o primeiro tema de Morrison Hotel, “Roadhouse Blues”, e ainda “The Jean Genie”, sendo a segunda vez que ouvimos David Bowie neste festival. Apesar de ser uma das minhas bandas preferidas desta edição do Vilar de Mouros, o seu concerto foi bastante low profile, provavelmente, apenas agradando aos fãs, sem acrescentar nada de novo ou tendo alguma coisa de diferente, o que foi agravado pelo facto de não terem permitido a passagem do concerto nos ecrãs gigantes, fazendo muitos perder a atenção facilmente. Em “Nothing Lasts Forever”, Ian, recorda a passagem da banda pelo festival em ’82 e junta a sua canção a “Walk On The Wild Side” de Lou Reed num dos momentos (talvez o único) mais bonitos de todo o concerto.
Foi num conjunto de 3 hits (“Bring On The Dancing Horses”, “The Killing Moon” e “The Cutter”) que os ingleses terminaram o seu concerto mais tarde regressando para o encore com “Lips Like Sugar”, canção que, provavelmente, conteve mais energia que o resto do concerto. Um concerto mais dedicado aos fãs que, infelizmente, não teve nem a duração desejada nem suficientes passagens por Ocean Rain, o quarto álbum da banda.
Setlist
Going Up
Rescue
Villiers Terrace/ Roadhouse Blues / The Jean Genie
All That Jazz
Seven Seas
Bedbugs & Ballyhoo
Over The Wall
Never Stop
Nothing Lasts Forever / Walk On The Wild Side
Bring On The Dancing Horses
The Killing Moon
The Cutter
Encore
Lips Like Sugar
Passadas duas horas subiram ao palco os OMD (Orchestral Manoeuvres In The Dark) com a sua estreia em Portugal. Iniciando o concerto com um dos maiores êxitos, “Enola Gay”, com uma interpretação impressionante, ultra energética e quase igual à versão de estúdio. Após “Radio Waves”, Andy McCluskey, pousou o seu baixo e anunciou boas e más noticias, as boas: que ia parar de tocar baixo, as más: que era a parte em que começava a dança. Foi assim que começou “History of Modern (Part 1)” e nos começou a mostrar os seus incríveis movimentos e energia de fazer inveja a qualquer um dos presentes. Como de costume para “(Forever) Live and Die”, Andy trocou de lugar com Paul Humphreys que conquistou (ainda mais) o público com a sua excelente voz.
Regressado aos vocais Andy promete que os OMD não voltarão a esperar 36 anos para vir a Portugal e que iam iniciar uma sequência de quatro músicas do seu mais famoso álbum, Architecture and Morality. Após “She’s Leaving”, a grande “Souvenir” e “Jean Of Arc” chegou “Jean Of Arc (Maid Of Oleans)” na qual era esperada uma actuação de dança ainda mais arrojada que não aconteceu mas facilmente se perdoa o artista/vocalista que aos 59 anos consegue ter mais energia que muitos alguma vez tiveram/têm/terão. Encerrando o concerto (e o dia do festival) tocaram “Electricity”, o primeiro single da banda, onde todos reuniram a réstia de energia para poder dançar uma vez mais ao som deste grande clássico.
Setlist
Enola Gay
Tesla Girls
Messages
Radio Waves
History of Modern (Part 1)
If You Leave
(Forever) Live and Die
She’s Leaving
Souvenir
Jean Of Arc
Maid Of Orleans
Talking Loud and Clear
Metroland
So In Love
Dreaming
Sailing On The Seven Seas
Locomotion
Electricity
27 de agosto
No terceiro e último dia do festival estava na altura de experimentar a praia fluvial, ao som de “Rebel Rebel” (última passagem por Bowie) vinda do soundcheck dos The Waterboys, a banda mais esperada de todo o festival o que se reflectiu no facto de todos os bilhetes para esse dia terem esgotado.
Samuel Úria iniciou os concertos deste dia 27 de Agosto apresentando o seu novo Dou-me Corda começando precisamente com o tema homónimo ao álbum. Um concerto mais direccionado para o rock e, como tal, teve poucas passagens pelo segundo álbum, O Grande Medo do Pequeno Mundo. Foi possível ouvir temas como “Aeromoço” e “Não Arrastes O Meu Caixão”, felizmente, foi tocado também o enorme tema “Lenço Enxuto”. Para terminar o concerto foi tocado “Teimoso”. Apesar de um concerto excelente faltou “Espalha Brasas” e “Império”. Um pouco mais tarde entrou em palco Bombino que durante cerca de uma hora partilhou com o público a sua música tão típica. Um concerto que “ganhou pontos” por ser muito diferente dos outros mas perdeu por ser muito repetitivo.
Um dos momentos mais esperados do festival chegou às 22:45 deste dia 27 de agosto quando os The Waterboys subiram ao palco e iniciaram o seu concerto com “Still A Freak” do seu mais recente álbum November Tale, que mesmo sendo uma canção recente deixou todo o público entusiasmado, pois apesar da música ser recente, continua com o mesmo sentimento e sonoridade das clássicas. Se a reacção foi boa com uma música desconhecida de metade do público “Medicine Bow” e “A Girl Called Johnny” foram ainda mais especiais e satisfatórias. Esta última teve uma duração de cerca de 10 minutos com diversos solos de piano pelo mestre Mike Scott. Ainda tivemos o privilégio de ouvir uma canção nova “Nashville, Tennessee” e um cover de “Roll Over Beethoven” original de Chuck Berry, que mesmo executado com toda a mestria da banda pode não ter sido uma escolha muito feliz pois “tirou tempo” para outros originais da mesma, numa setlist que foi bastante curta para a experiência e história da banda.
Seguiram-se os maiores e mais conhecidos temas dos Waterboys, “The Whole Of The Moon” e “Fisherman’s Blues”, o que fez o público transbordar de alegria, muitos ouviam os temas da sua infância, outros escutavam algumas das canções mais importantes da década de 80. Um concerto que em termos de execução foi mais que excelente que deixou vontade de um regresso próximo da banda ao nosso país que pecou pela setlist demasiado curta que nem teve direito à cover de “Purple Rain” que já é costume no encore.
Setlist
Still A Freak
Medicine Bow
A Girl Called Johnny
We Will Not Be Lovers
Nashville, Tennessee
Long Strange Golden Road
Glastonbury Song
Roll Over Beethoven
The Whole Of The Moon
Fisherman’s Blues
A última banda internacional a actuar no festival foram os Tindersticks que já tinham passado no nosso país este ano e voltaram a atuar outra vez. Trouxeram consigo o seu novo álbum, The Waiting Room, e as expectativas eram elevadas. Infelizmente o concerto não atingiu as expectativas, as músicas não transmitiram o sentimento devido e foram bastante monótonas. “Were We Once Lovers?” e “How He Entered” foram, provavelmente os temas melhor executados e “Hey Lucinda”, um dos meus preferidos do álbum, o pio. Trata-se de um dueto cuja parte de Lhasa de Sela (presente em estúdio) foi totalmente ignorada tirando toda a magia da canção. O concerto terminou com os clássicos da banda “This Fire Of Autumn” e “My Oblivion”.
Setlist
Like Only Lovers Can
Second Chance Man
Were We Once Lovers?
Say Goodbye To The City
If You’re Looking For a Way Out
Boobar Come Back To Me
Hey Lucinda
How He Entered
We Are Dreamers!
Show Me Everything
This Fire Of Autumn
My Oblivion
Seguiram-se os Blasted Mechanism, explosivos como sempre. E com a promessa do regresso para o ano terminou a edição comemorativa dos 50 anos do Vilar de Mouros, uma edição com bastante sucesso que teve um cartaz histórico e único.
Texto: Francisco Lobo de Ávila
Fotografia: Rui Gameiro