De regresso a mais uma edição do Cinco Discos, Cinco Críticas desta feita com análises aos mais recentes discos dos norte-americanos Conduit, com o seu Drowning World (Kitschy Spirit, 2018); ao britânico QUAL com o EP Cyber Care (Avant! Records, 2019); ao norte-americano Panda Bear com o mais recente Buoys (Domino Records, 2019); aos estado-unidenses Monobody com o disco Raytracing (Soft Greens Music/ASCAP, 2018) e, para finalizar ao split entre Hirotika e Das Monstrvm – Sound Ov Machinas (Favela Discos, 2019). As críticas às referidas edições podem ler-se abaixo.
Drowning World | Kitschy Spirit | setembro de 2018
8.5/10
Os Conduit são um quarteto baseado em Nova Iorque, composto por membros e ex-membros dos Twin Stumps, Pop. 1280, White Suns, e Squad Car e, no ano passado lançaram o seu LP de estreia, o Drowning. A carreira discográfica dos Conduit é ainda marcada por um álbum gravado durante uma atuação ao vivo na estação de rádio WFMU e pela sua Demo (ambos estes trabalhos são de 2016). Destes dois trabalhos prévios, sobreviveram os temas “Hypnagog”, “End Times” e “Reducer”, sendo que estes dois se encontram em Drowning World na mesma sequência em que na Demo – o trabalho de onde foram resgatados/repescados. Em dois anos, é visível a maturação do projeto. Os Conduit saíram da garagem e poliram a sua sonoridade, mantendo-se ainda assim dedicados à exploração das fronteiras do noise experimental e da sua intersecção com o universo do punk visceral e sujo, o que os enquadra no mesmo plano sonoro dos Anxiety e dos Uniform. É também notável a melhoria substancial dos valores de produção em Drowning World quando comparado com os esforços anteriores da banda. O tempo dispendido na produção do disco traduz-se num output nítido que acrescenta definição (podemos discerner as várias camadas de vocais e instrumentação) sem retirar força à parede sonora que por vezes se abate sobre nós (basta compararem as versões mais datadas de “Reducer” e “End Times” com as versões do Drowning World).
Em todos os sentidos, este é o primeiro disco “a sério” dos Conduit. Um testemunho do quanto a banda evoluiu e mais uma prova (como se fossem precisas mais) de que a música niilista feita com guitarras está viva. Para fãs dos Anxiety e dos Uniform.
Edu Silva
Cyber Care | Avant! Records | fevereiro de 2019
8.0/10
Cerca de um ano após a edição do EP Cupio Dissolvi e do vanguardismo estético do segundo longa-duração The Ultimate Climax, QUAL está de regresso às edições de estúdio com Cyber Care EP, o novo rebento de William Maybelline (Lebanon Hanover) que se estrutura ao redor de quatro potentes faixas. Se já nas edições anteriores QUAL se mostrava cada vez mais distante de géneros como o post-punk ou a coldwave, neste Cyber Care o produtor abraça em finito géneros como a EBM, o techno e a eletrónica mais obscura. É a nova evolução do ressuscitado movimento gótico que se está a fazer ouvir cada vez forte nas tendências. Num registo completamente incendiário QUAL inaugura o conceito deste novo EP através do tema homónimo “Cyber Care”, um reflexo poderoso sobre a nova era digital e os contratempos associados, a funcionar como uma descarga rítmica de música altamente cybergoth. A estagnação significa a morte para William Maybelline e é por isso que a cada disco lançado, surge associada uma nova perspetiva musical. Agora a explorar bem forte o techno e a música industrial QUAL mostra ainda a ironia da vida contemporânea com a necro “Inject Your Mind” e, essencialmente, com os versos e a voz de “I Have To Return Some Video Tapes”. A fechar com “Motherblood” (que vem retomar a estética musical de temas como “Rape Me On The Parthenon”) QUAL apresenta mais um trabalho que prima pelo resultado final.
Sónia Felizardo
Buoys | Domino Records | fevereiro de 2019
7.0/10
O regresso de Panda Bear às edições vem na forma de Buoys, o quinto (sexto se contarmos o disco homónimo, de 1999) longa-duração a solo do percussionista/ teclista/guitarrista dos norte-americanos Animal Collective. O sucessor do excelente Panda Bear Meets the Grim Reaper volta a contar com a produção de Rusty Santos, o mesmo que produziu Person Pitch no já distante ano de 2007 e que levou Noah Lennox para o estrelato da esfera indie.
Naquele que pode ser considerado o seu álbum mais despido até à data, o músico residente em Lisboa explora novas estratégias formais num exercício de constante exploração que é tão satisfatório quanto polémico e divisivo. Como que uma versão moderna de Young Prayer, menos cacofónica é certo, Buoys aproxima-se das propriedades pastorais do disco de 2004. Menos cru e rudimentar que o supracitado, Buoys apoia-se numa forte componente instrumental, rica em texturas e efeitos subaquáticos que se complementam por uma forte linha de sub-graves. O fascínio de Noah pelas produções da música dub e, mais recentemente, do trap, levaram-no a explorar o potencial dos sons de baixa frequência, assim como o uso invulgar de auto-tune que lhe traz um caracter versátil e de grande plasticidade vocal. A tudo isto junta-se a constante dos acordes de guitarra, em repetições circulares e hipnóticas que são tão puras quanto alienadas. Acima de tudo, há uma sensação de conforto e de regresso a um porto que nos é, e sempre será, familiar e seguro.
Filipe Costa
Raytracing | Soft Greens Music/ASCAP | novembro de 2018
8.4/10
O segundo álbum da banda de Chicago Monobody é seguramente interessante, sinceramente até dir-se-ia mesmo que o registo – ou porque não, até mesmo a banda em si – é um hidden gem negligenciado por vários audiófilos no decorrer da reta final do ano que findou. A direção sonora da banda é de certo modo ambiciosa, nem que seja só no que toca a termos técnicos, pois propõe-se a cruzar o minimalismo provocador do math rock com a vivacidade contagiosa do jazz de fusão, duas estéticas tão díspares e que ao mesmo tempo, mantêm alguma similaridade devido ao facto de que partilham a tendência insistente em enveredar por riffs desafiantes e cativantes e por ritmos propícios a mudanças abruptas e alucinantes. Então conclui-se de que falamos aqui essencialmente de um pequeno behemoth que tanto bebe influências de bandas como Weather Report como de Don Caballero, e os resultados têm sido gradualmente estimulantes devido à mestria notável dos instrumentistas da banda e às imensas camadas sonoras dispostas de forma bem executada e bastante complexo. O tema-título, “Former Islands” e “Opalescent Edges” são exemplos do espírito aventureiro refletido no ADN musical destes meninos.
Ruben Leite
Sovnd ov Machinas | Favela Discos | janeiro de 2019
6.5/10
Sovnd ov Machinas é o primeiro lançamento do ano com o selo da portuguesa Favela Discos e surge da colaboração entre o português Das Monstrvm (um entusiasta dos campos D.I.Y.) e o artista japonês Hirotika (um anarquista autoproclamado). O disco surgiu devido ao grupo de Facebook Synthesizers and Drum Machines e conta com um total de nove faixas, cinco de Hirotika e quatro de Das Monstrvm, onde ambos partilham os mesmos métodos de produção e a visão de uma pista de dança a sentir forte e feio. Este split, que trabalha ao redor de géneros como o techno, a eletrónica e/ou industrial, foca-se numa música inibida de voz, a qual conduz o ouvinte a viajar pelas intermitências do seu pensamento e o convida a pensar na possibilidade de humanização das máquinas. De Hirotika os grandes destaques vão para temas como “Mundus Imaginalis” – com os sintetizadores iniciais a soar em jeito darkwave e posteriormente a avançar para territórios mais retro e techno – e ainda para a chapada sonora experimental “The Needle”. Já de Das Monstrvm, as “jams” mais apelativas encontram-se em “What is left after” e no witch-house experimental de “and decadence”.
Em suma Sovnd ov Machinas é um disco que peca pelas suas músicas de desenvolvimento extremamente extenso mas que, contudo, surpreende pela imagética, conceito e história envolventes. Para os fãs destas andanças eletrónicas, o resultado será certamente positivo.
Sónia Felizardo