Reportagem: MONITOR 2019 [Stereogun, Leiria]
Reportagem: MONITOR 2019 [Stereogun, Leiria]
Junho 4, 2019 1:00 pm
| Reportagem: MONITOR 2019 [Stereogun, Leiria]
Junho 4, 2019 1:00 pm
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Foi no passado sábado, 25 de maio, que a Stereogun voltou a receber em Leiria mais um histórico encontro entre o público e os artistas emergentes cuja estética sonora se enquadra, de alguma forma, dentro dos ambientes da minimal wave e post-punk. O MONITOR já não é desconhecido no meio de nós e posiciona-se cada vez mais num patamar altamente cobiçado: ser o melhor festival dedicado às já mencionadas abordagens estilísticas ao nível nacional. E internacional (!) como se pode verificar no “sobrenome” de origem: Minimal Wave & Post-Punk International Rendez-Vous. Com três edições altamente memoráveis na carreira, a quarta edição do MONITOR juntou-se a mais um passado emblemático com a assinatura da Fade In, trazendo à cidade do Lis um total de seis nomes a estrearem-se pela primeira vez em território nacional: Potochkine, Talk To Her, Structures, SDH, Tango Mangalore e Marta Raya.
Por volta das 18h20, começa por subir a palco o projeto da polaca residente em Berlim, Marta Raya. A abrir concerto com “Inner Movement”, tema de abertura do disco de estreia Hidden Emotions – que naquele sábado celebrava o seu primeiro aniversário – e, progredindo com “Longing for…”, o universo musical de Marta Raya rapidamente nos trouxe à memória as paisagens melancólicas a que temos sido habituados a escutar em trabalhos de nomes como Hante. (que o ano passado também tocou no MONITOR), Minuit Machine, Selofan, e o lado da eletrónica mais negra de nomes clássicos como Clan Of Xymox e Xmal Deustchland. A artista continuou a performance a seguir “à letra” o alinhamento do disco de estreia tendo tocado, de seguida, “Follow Your Traces” – cujo final serviu para que Marta Raya ocultasse a sua cara do público com um pano preto; “Those Severe Times” – a funcionar como pano de fundo a uma pequena performance; e a ainda super animada “Automatisch” para aquecer a matiné de sábado, que se esperava longa.
Para os conhecedores de Hidden Emotions a setlist restante já não era, portanto, nenhuma novidade, ouvimos “Vicious Circle” – onde Marta Raya libertou toda a sua energia negra – e, para a despedida, a decadência sonhadora de “The Sadness of Gaia”, tema a ser finalizado com um sincero obrigado nas palavras reverberadas da artista. Com uma duração aproximada a 40 minutos a performance de Marta Raya teve fim pelas 18h58.
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Depois daquela pausa para cumprimentar as caras conhecidas enquanto o palco se preparava para receber a vinda do marinheiro Loreto D’Amato, foi por volta das 19h13 que, em Leiria, Tango Mangalore deu à costa. A abrir concerto com um diálogo para o público, “I’m Tango, right? And the music is weird so you might as well have some fun, dance, I don’t know, bite each other, do your thing!” Loreto D’Amato rapidamente fez ecoar “Overture II” para um público bastante contemplativo enquanto o preparava para uma dose de sintetizadores com ambientes macabros que se iniciou com “La Fin Absolue Du Monde”.
Sob uma dose de fumo e projeções do alto mar fez-se ouvir em sala “Cry Madame”, tema que acabou com o sempre extrovertido Loreto D’Amato a fazer aquela comunicação casual, “Thank You! Ah… yeah” antes de quebrar a sala com um dos “hits” de carreira, “Mort Marin ✞”. Festa instalada e a dança da decadência a fazer sentir-se bem fervorosa na sala da Stereogun. “Bravo” gritavam os espetadores, entre aplausos e assobios de entusiasmo. Entre as músicas de Comandante Macabro (Liquid Bass Records, 2015) e as mais recentes, presentes no último disco de estúdio, Dear Shore (Fabrika Records, 2018), Tango Mangalore soube conduzir uma performance amplamente estimulante e divertida. Ouvimos “The Absentee (Stay)”, “Pariah”, “Disco Werewolf” – um dos temas colaborativos com DoCtor MuTantO – e ainda uma versão encurtada do tema “Drag_cula II”.
O concerto de Tango Mangalore foi sem dúvida um dos momentos mais queridos e sinistros da quarta edição do MONITOR. E certamente um daqueles que perdurará na memória. A sua música animada, com uma sonoridade tão poderosa e cativante intercalada com aquela voz fantasmagórica e q.b. cadavérica fez deste concerto uma representação muito fidedigna da famosa curta-metragem The Skeleton Dance. Com uma duração aproximada a 50 minutos o concerto de Tango Mangalore teve término por volta das 20h04 com “The Menagerie” a marcar a despedida de Leiria.
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Por volta das 20h15 a dupla espanhola SDH (Semiotics Department Of Heteronyms) entrou em palco com Sergi Algis a ocupar o espaço atrás dos sintetizadores, do lado direito e Andrea P. Latorre, munida do microfone e com um espaço livre para nos presentear com a sua dança interminável, do lado esquerdo do palco. A dupla, que também é conhecida pelo seu trabalho paralelo com a editora Cønjuntø Vacíø e por serem dos membros da banda Wind Atlas, abriu concerto com o tema “Abandon”, retirado do EP Tell Them (Avant! Records, 2018) e uma energia altamente hipnotizante por trás. Uma das características que logo soltou à vista nesse momento foi a incrível voz que Andrea Latorre possui – nunca desafinou, nunca saiu do timbre -, além da sua beleza altamente devastadora e contemplativa. Seguindo, sem pausas na setlist, para “What Did I Come For?”, o espetáculo de dança com que Andrea Latorre nos presenteou naquele fim de tarde de sábado foi-se tornando cada vez mais especial com o avançar do concerto e em temas como “Guilty And Gifted”, “She Uncovers Before Me”, “The Scent” e “Tell Them”, todos eles retirados do disco de estreia Semiotics Department Of Heteronyms (Avant Records!, 2018).
Apesar de ter sido um concerto que, no geral, dividiu opiniões a estreia dos SDH em Portugal foi mais uma aposta bem executada da Fade In e garantiu uma performance à medida para encerrar a primeira parte do nosso querido MONITOR: interessante e propícia a uma viagem calma entre o mundo da synth-pop cruzada com os traços do techno e da EBM ligeira. A fechar com o tema “I Mean” os SDH abandonaram o palco por volta das 20h57.
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Uma das grandes apostas do MONITOR 2019 estava virada para os franceses Structures que o ano passado garantiram um pomposo destaque nas edições alternativas de 2018 com o seu EP de estreia Long Life. O quarteto de Amiens que categoriza a sua música de Rough Wave chegava a Leiria, em estreia absoluta a nível nacional, para conquistar o coração da cidade do Lis com uma energia jovem, mas com um potencial esmagador para render multidões. A abrir concerto por volta das 23h23 com “Rough Wave” – um dos temas novos que apresentaram naquela noite – os Structures emanavam uma energia louca em palco! O vocalista e guitarrista Pierre Seguin vestia a sua stage persona e – entre uns “How does it feel?” e uma presença marcante em palco – acompanhado pela instrumentação de Adrien Berthe (guitarra, sintetizadores), Marvin Soares (baixo) e Oscar Siffritt (bateria), a banda abriu a segunda parte do MONITOR de forma seminal.
Entre um “Hey, we are Structures and we come from France” e muitos aplausos e assobios por parte do público, os Structures prosseguiram concerto com o já conhecido “Long Life” que encheu os espetadores de energia e os fez cantar em uníssono com os Structures “I LIVE A LONG A LIFE!“. Entre um “Obrigado” e um “Força Porto” os Structures prosseguiram performance com os temas de Long Life (Rockerill Records, 2018): “Pyramids”; o muito esperado “Dancers” – um daqueles temas do EP que fica facilmente colado no ouvido às primeiras audições e que em Leiria se fez ouvir bem rigoroso e gerou entre o público uma euforia altamente contagiante; o multifacetado “Embassy”; e ainda “Satellite”. “That’s our first time in Portugal. We are very pleased to be here tonight“, disse Pierre, enquanto os Structures preparavam o público português para mais uma das músicas inéditas que ainda não foram editadas – “Immortals”. A sonoridade dos Structures é simplesmente deliciosa ao vivo: é crua mas ao mesmo tempo é suave; é caótica mas também regrada, de qualquer modo é amplamente contagiante, emotiva e estruturada. É incrível!
Já a aproximar-se da reta final, o concerto dos Structures ainda aportava na setlist o tema de Long Life que ainda não se tinha feito ecoar naquela noite, “Arabian Knights Club”, para um público destemido e muito maravilhado com a performance que se exibia diante de si. Para fechar o concerto em Leiria os Structures reservaram na bagagem mais duas malhas inéditas, “Silent” e “Robbery”, dois grandiosos temas que, para muitos espetadores, os fez receberem o crachá da melhor performance do MONITOR 2019. Um concerto brutal, uma energia louca e uma banda surpreendente que se despediu do palco por volta das 00h15.
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Outra das surpresas que o MONITOR 2019 ainda tinha reservado para nós ficou à mercê da performance dos italianos Talk To Her. A banda de Riccardo Massaro (baixo), Stefano Murrone (guitarra), Andrea Visaggio (voz, sintetizador) e Francesco Zambon (bateria) subiu a palco por volta das 00h37 para iniciar um novo capítulo da noite com um tema inédito, ainda sem nome definido e que, certamente, integrará o alinhamento do disco de estreia da banda esperado para o final deste ano. “Good evening everybody, this is our first time in here” avançou Andrea mesmo antes dos Talk To Her fazerem ecoar em sala o primeiro tema conhecido da noite – “Nightfall” – retirado do EP de estreia Home (Shyrec, 2018). Marcava-se assim mais um momento histórico no MONITOR. É que este concerto, além de ser o primeiro da banda em Portugal foi também o primeiro concerto de carreira da banda fora da Itália.
Se, depois da performance dos Structures surgiam dúvidas sobre a possibilidade dos Talk To Her conseguirem dar um concerto tão bom como o anterior, a verdade é que os meninos italianos subiram o palco para tirar o fôlego ao público presente. A sua sonoridade poderosa, negra e altamente estimulante, cantada por uma voz vinda da penumbra foi certamente a cereja no topo do bolo para muitos dos espetadores presentes. Seguiu-se “Zodiac”, tema que no MONITOR se fez acompanhar com projeções do videoclip de origem, até entrarmos num ambiente desconhecido com novos temas que, ainda seguem sem título, mas que deixaram os espectadores mortinhos para conhecer a versão em estúdio. Sempre no final de cada música os Talk To Her deixaram espaço aberto para receber inúmeros aplausos sem, contudo, se dirigirem ao público na maioria das vezes. Depois de se ouvirem quatro novos temas, tivemos a oportunidade de ouvir “AWAY/AFRAID”, tema que não integra o alinhamento de Home, mas que já tem uma versão a circular pela internet, disponível aqui. Este foi sem dúvida um dos grandes momentos da noite, uma construção e desconstrução sonora que meteu a sala do MONITOR a aplaudir!
E agora imaginem lá como é que foi o restante desenvolvimento e culminar desta estreia sorumbática? Incrível, como não poda deixar de ser. Os Talk To Her são muito bons ao vivo, afinal já não é só o hype do EP, é mesmo real! Prosseguimos concerto com o icónico tema “Forest”, a primeira canção da história dos Talk To Her que em Leiria foi recebida em incontáveis aplausos. Num concerto que teve uma duração aproximada a 55 minutos os Talk To Her despediram-se do público português com mais duas malhas inéditas, que contabilizaram assim um total de sete músicas novas apresentadas em exclusivo naquela noite de sábado. O concerto deu-se por terminado às 01h32 depois de termos ouvido o tema de encerramento do EP de estreia, “Home”.
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POTOCHKINE
Já a aproximar-nos do fim do melhor festival de minimal wave e post-punk de Portugal eis que, a Fade In nos mostra como ainda tem trunfos no baralho. Se Structures e Talk To Her já tinham sido megalómanos, então agora preparem-se para algo ainda mais marcante: a performance de estreia da dupla francesa Potochkine. Tudo começou por volta das 01h52 com a vocalista Pauline a dirigir-se ao fundo do palco e deitar-se no chão atrás dos microfones e instrumentação, junto a uma máquina de fumo eminente e com a cara tapada por um pano preto. Foi assim que começou. Pouco tempo depois subiu ao palco Hugo, o dono das caixas de ritmo e dos sintetizadores. Em seguida Pauline “reencarnou” dos mortos para, juntamente com Hugo, nos fazer ouvir “Dans Ta Face”, tema retirado do disco homónimo Potochkine (Data Airlines Records, 2018). Tudo ainda muito estranho mas pronto para ser explicado ao longo do seu desenvolvimento.
Os Potochkine prosseguiram concerto com “Le Bachique”, entre outras quantas malhas, enquanto Pauline nos ia demostrando a sua estrondosa capacidade de despersonalização expressa corporalmente e em voz, com foco em dois microfones. Gritos à Diamanda Galás, uma energia louca e uma boneca incorporada no mundo humano. Por trás, a presença masculina de Hugo a fazer o equilíbrio perfeito. Noite de dança instaurada assim que se ouve em sala “Jumeaux”, mais um dos bastante conhecidos temas do disco homónimo. Os gritos de loucura do público que precederam o término de cada canção falavam bem alto. O concerto/performance dos Potochkine foi algo muito interessante de experienciar, com várias interações com o público, através de elementos ora teatrais ora apenas de contacto mais próximo com os espetadores, através de “invasões” ao espaço da plateia.
Assim que se ouve “Quand Les Autres Nous Effraient” está demonstrado que os Potochkine são grandes animais de palco. Se, o trabalho audiovisual para esta faixa mostrava uma Pauline muito estática, na Stereogun ela estava provocante, descontrolada: uma rainha poderosa. E o público também! É neste ambiente de folia que “Destruction” começa a ecoar para uma sala altamente sedenta pelas batidas da sua eletrónica inspirada nas vertentes do techno e da EBM. Ouve-se ainda “La Fête Narcisse” e depois de uma dança perdida no tempo voltamos a posicionar-nos quando Pauline começa a ecoar “Attendre” em repetido. Chegava então a altura pela qual a maioria do público esperava, os Potochkine iam cantar o grande hit de carreira: “Je Deteste Attendre“. Ai que loucura que foi. Aquele baixo sintetizado no máximo, Pauline a dar uma nova apresentação ao tema e um público completamente em êxtase. Afinal, valeu a pena a espera. Já mesmo a chegar ao fim, para nosso infortúnio, os Potochkine despediram-se de Leiria com “Charivari Furieux”. O MONITOR 2019 teve, assim, término pelas 02h52.
À quarta edição e, com um cartaz que a uma primeira vista poderia ser interpretado como menos estimulante que o do ano passado, a verdade é que o festival MONITOR voltou mais uma vez a surpreender numa edição que, no geral, garantiu experiências ainda mais únicas e emblemáticas que as experienciadas em edições anteriores. A cada ano que passa é de louvar o incrível trabalho que a Fade In tem desenvolvido em Portugal, ao esforçar-se por trazer pequenas bandas que têm um potencial enorme para conquistar o público e um profissionalismo e rigor inerentes que não se encontram em qualquer lado. A quarta edição do MONITOR foi icónica e certamente, para muitos, uma edição histórica. Por estes lados já se contam os meses para a quinta edição. Que a espera seja curta!
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Texto: Sónia Felizardo
Fotografias: Miguel Silva