Cinco Discos, Cinco Críticas #50

| Outubro 6, 2019 12:40 pm

Já são 50 as edições do Cinco Discos, Cinco Críticas e, no total, 250 discos sobre os quais opinámos desde que lhe demos início. 


Para encerrar esse mágico número nesta edição relembramos os lançamentos de estreia dos portugueses Omie Wise, com To Know Thyself (self-released); Lola’s Pocket PC com o homónimo Lola’s Pocket PC (self-released) e ainda a grande surpresa na cena darkwave os Figure Section com o EP Spectre (Aufnahme + Wiedergabe). Já nas bandas que se repetem nos discos entram os californianos Monarch com Beyond The Blue Sky (El Paraiso). Para fechar, a estreia do novo projeto da editora Kaczynski Editions, com a edição de THE URBAN TAPE pelos artistas zerogroove e Alessandro Bocci.


Aproveitem para descobrir melhor estes trabalhos no Cinco Discos, Cinco Críticas #50.

To Know Thyself | self-released | setembro de 2019 

7.7/10 



Fundados em 2016, e depois de um EP de estreia (1808) que serviu como pretexto para vários concertos por inúmeros festivais e que foi fulcral para reunir um quinhão de atenção como parte dos novos valores portugueses musicais, os bracarenses Omie Wise mandam assim para fora o seu primeiro registo em formato longa-duração, intitulado To Know Thyself
Destes marmanjos, pode-se esperar um hard rock de tendências progressivas e de peito feito, mas sem nunca descurar as sensibilidades mais melódicas que lhes dão uma faceta mais modernizada. Os arranjos musicais aqui tomados a cabo adotam sons reminiscentes de nomes como Jethro Tull e Blue Oyster Cult, ou seja, estes meninos não se coíbem de ser influenciados por exemplos mais old-school e, como resultado acabam por demonstrar uma faceta mais madura no seu ADN. Quer-se com isso dizer que pegando nessas mesmas influências, moldam-nas de modo a formar uma sonoridade sem pretensões de maior e que se revela tanto etérea como de barba rija, mas sem grandes surpresas, para o bem e para o mal. Momentos de dimensão épica como o órgão intimidante em “Umbra”, a aventura sonora em forma de tensão contida em “Dead Wings Fly Higher Pt.1 e 2”, o folk psicadélico com floreados medievais de “Make a Knot” e a agressividade pseudo-stoner em “Something Wicked Stands Behind Me”, revelam que estes meninos dominam a arte de rockar como gente crescida.

Rúben Leite







Lola’s Pocket PC | self-released | janeiro de 2019

7.0/10



Lola’s Pocket PC é um dos projetos de Sputnik, mais conhecid@ por Weatherday. Enquanto que os lançamentos por esse nome envolvem uma sonoridade lo-fi noise pop, com guitarras e distorção, Lola’s Pocket PC abraça um som eletrónico, onde a estética DIY se junta a um electropop alternativo e minimalista. O lançamento de estreia deste projeto é um álbum homónimo conceptual e narrativo no qual é contada uma história sobre uma rapariga chamada Lola, que “hackeia” o telemóvel da narradora e a relação entre as duas. 
A narrativa desenlaça-se ao comando de uma voz envolta em efeitos e rodeada por sintetizadores. Imersos em reverb e acompanhados por drum machines, estes parecem saídos dos anos 80 e definem toda a estética do álbum. As principais melodias instrumentais escondem a voz enquanto arpejos, acordes e simples linhas de baixo preenchem o fundo sem grandes variações de ritmo. Esta falta de dinâmicas entre as diferentes faixas faz com que estas demasiado uniformes e possam tornar-se apenas música de fundo para os ouvintes menos interessados ou atentos. 
Não é inovador e a composição das canções não é especialmente brilhante, mas fãs do género podem encontrar em Lola’s Pocket PC uma agradável meia hora, na qual sobressaem “Pocket PC” e a extensa “Lola”, com 15 minutos de duração.

Rui Santos







Spectre EP | Aufnahme + Wiedergabe | outubro de 2019 
8.0/10 



Os Figure Section são a mais recente adição ao catálogo da alemã Aufnahme + Wiedergabe e chegam numa estreia em curta duração com Spectre, um EP a situar-se nos espectros do techno, industrial e minimal synth, com uma eletrónica altamente poderosa e abrasiva. A dupla formada pela cantora e atriz austríaca Olivia Carrère e o produtor belga Yannick Franck (Raum, Orphan Swords), estreia-se nas edições de estúdio com três novas faixas completamente imersivas, onde a eletrónica conduz o ouvinte a uma ação quase instantânea. 
O EP abre com o tema homónimo “Spectre” – cuja estrutura musical faz lembrar o ambiente sonoro que os Boy Harsher têm produzido nos últimos anos (e que se tem mostrado uma fórmula de sucesso mundo fora) e a voz, por vezes pálida, traz algumas referências à persona de Larissa Iceglass (Lebanon Hanover). É, contudo, em “Disfigured Section” que os Figure Section mais nos provocam criando um ambiente altamente característico e pessoal. A voz de Olivia Carrère torna-se só sua e a eletrónica de Yannick Franck entranha-se quase de automático no ouvido, trazendo ainda umas colagens sonoras no final, bastante bem incutidas. “Slick” dá por encerrado o primeiro trabalho com uma produção altamente estimulante e uma ambiência industrial manipulada na quantidade certa. 
Os Figure Section chegam em 2019 ao catálogo das novas bandas que, dentro em breve, estarão a circular pelos festivais mais góticos da Europa. Com o primeiro single “Teutonic Knights” a chegar às playlists dos mais atentos em março, é com este Spectre que a dupla se começa a integrar no novo cenário underground com boa distinção, deixando os ânimos bem altos para um longa-duração de estreia. A ver vamos.

Sónia Felizardo







Beyond the Blue Sky | El Paraiso | agosto de 2019


7.0/10





Há poucas coisas nesta vida que temos o poder de prever com verdadeira exatidão. Justo dizer que amanhã o sol vai nascer, que o céu vai continuar a ser azul e que o próximo álbum a ser lançado pela El Paraiso vai ser um deleite psicadélico. 
Desta vez, a prolífica e consistente editora dinamarquesa lançou um álbum dos californianos Monarch, o seu segundo álbum de longa duração. A banda constituída por Dominic Denholm, Thomas Dibenedetto, James Upton, Matt Weiss e Andrew Ware apesar de estar separada por um vasto oceano dos seus colegas de editora, bandas como Causa Sui (cujos membros Jakob Skøtt e Jonas Munk são fundadores da editora supramencionada) ou os Mythic Sunship, apresentam um som bastante semelhante a estes conjuntos europeus, no que diz respeito às longas jams dentro das músicas unidas, não com cuspe, mas sim com ritmos kraut, composições inspiradas no rock progressivo dos Emerson, Lake and Palmer e alguns devaneios jazz com belos instrumentos de sopro a lançarem em selvagens solos. 
Dada a influência geográfica dos Monarch, estes apresentam uma subtil (mas grande) diferença quando comparado com o restante elenco da El Paraiso e confere-lhes uma personalidade diferente. O toque americana nas suas músicas (que na faixa homónima do álbum chega a roçar o country) faz lembrar as malhas mais tempestuosas de bandas como Lynyrd Skynyrd ou os The Allman Brothers Band e tem momentos onde dão uma clara piscadela de olhos ao Ted Nugent solos e riffs muito rock and roll. 
Beyound the Blue Sky é um deleite para os sentidos. As suas longas e descomprometidas faixas tanto dão vontade de soltar os cabelos ao vento enquanto conduzimos uma pick-up por um árido deserto como são perfeitas para ouvir com fones enquanto estamos deitados numa refrescante sombra de olhos fechados. Mais um belo álbum com selo da El Paraiso, que se confirma como uma das melhores e mais consistentes editoras dentro do rock psicadélico mais experimental, e dos Monarch que se afirmam como um nome sério dentro deste estilo musical.

Hugo Geada






KACZYNSKI TAPE SESSIONS – THE URBAN TAPE (zerogroove/Alessandro Bocci) | Kaczynski Editions | outubro de 2019 

7.0/10 



A editora italiana Kaczynski Editions tem um novo lançamento agendado para este mês, tratando-se de uma edição inserida numa nova série a que chamaram KACZYNSKI TAPE SESSIONS que consiste na edição de uma cassete com um total de 30 minutos de duração, dois artistas convidados, 15 minutos para cada artista e um tema base no qual os sons resultantes se devem inspirar. 
A primeira cassete conta com a participação de Giuseppe Fantini (zerogroove, guitarra e maquinaria nos projetos ranter’s Groove e zero23) e Alessandro Bocci (membro regular dos Starfuckers, banda de culto de vanguarda italiana) e chega às prateleiras a 15 de outubro sob o cunho de THE URBAN TAPE. Nesta cassete ambos os artistas propõem a sua visão urbana do som, num total de sete músicas, quatro trabalhadas por zerogroove – a mostrar a sua imagem esquizoide dos subúrbios urbanos – e três assinadas por Alessandro Bocci – numa abordagem sombria e alucinada da paranoia urbana. Esta é uma edição altamente estimulante para os fãs da eletrónica, onde ganham destaque temas como “ASESINO (samba overdrive)” – assinado por zerogroove e a fazer lembrar o clássico single dos Kraftwerk, “Autobahn” – e ainda “SHAKE THE GATE”, assinado por Alessandro Bocci, a trazer uma abordagem mais punk ao resultado final deste trabalho colaborativo. 
THE URBAN TAPE – a primeira série de um projeto que artisticamente transparece ser muito rigoroso, bem pensado e pronto para surpreender os fãs da eletrónica contemporânea – apresenta a peculiaridade de ser uma cassete feita em madeira e pintada à mão com spray. Esta edição, bastante singular e ultralimitada estará disponível a partir do dia 15 de outubro, mas já a podem disfrutar na íntegra abaixo.

Sónia Felizardo





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