Da urgência do desabafo surge a escuridão que nos comove
Devlloz, músico brasileiro de 24 anos atualmente a viver em Lisboa, lançou no passado dia 15 de novembro o álbum Vampyre’s Romance, obra de uma crueza emocional verdadeiramente implacável onde a realidade diária é apresentada como um inferno sem saída. Ali entre o emo e o goth rap, com referências ao rock alternativo e à eletrónica, explora um som tão negro quanto emotivo, alimentando-se de uma vulnerabilidade espantosamente penetrante que chega mesmo a soar poética, como um grito de libertação que ecoa bem alto na alma para nos deixar estarrecidos. Pegando na temática vampiresca para melhor ilustrar a angústia da alienação social sentida por um “outsider” a lutar com demónios interiores e a viver numa cidade que não a sua – no fundo, a “não pertença” como estado de espírito de quem vagueia na certeza de não saber como será o amanhã -, Devlloz constrói um universo onde a melancolia decadente se transforma numa fragrância inebriante. Por vezes surgem passagens que nos remetem para o mundo insólito e delicado de Yves Tumor (sobretudo num certo “nervosismo” a nível vocal), mas permanece a sensação de que estamos perante algo bem pessoal, um diário sonoro de fragilidade sedutora que tanto sugere um escape como parece buscar inconscientemente a empatia.
Produzido pelo artista brasileiro Dattpurpp e co-produzido, mixado e masterizado por Kamuya, com a capa idealizada pelo ilustrador russo Sad69kun, Vampyre’s Romance não é uma escuta fácil, mas o ”mergulho” na intimidade deste universo volátil é uma experiência incrivelmente poderosa. Agora é escutá-lo com amor e atenção, para que da dor individual se passe para a catarse coletiva.
Texto redigido por Jorge Alves
