Reportagem: Sun Mammuth + FourToSix [Espaço A – Freamunde]
Reportagem: Sun Mammuth + FourToSix [Espaço A – Freamunde]
Novembro 3, 2018 4:23 pm
| Reportagem: Sun Mammuth + FourToSix [Espaço A – Freamunde]
Novembro 3, 2018 4:23 pm
| © Iolanda Pereira / Sun Mammuth |
Antes de mais, desculpem o atraso. Logo vou ser breve para compensar o meu desleixo involuntário… Fui enviado no passado dia 26 de outubro por esta revista a visitar Freamunde perto de Penafiel para assistir a uma gig de rock e afins, no Espaço A, um lugar que recomendo caso se percam nessas terras do interior norte.
Lá, FourToSix abria para Sun Mammuth nesse humilde estabelecimento que recebeu todos bem.
© Fourtosix |
Parte I – Four To Six
Por volta das vinte e três horas, Fourtosix fizeram-se ouvir o seu Set de 10 músicas que roçam entre o rock alternativo, indie ou até mesmo grunge, sei lá, perguntem a eles.
Vox – Guilherme Rodrigez
Guitar – Fernando Serrão
Baixo – Mário Marques
Bateria – Pedro Almeida
Guitar – Fernando Serrão
Baixo – Mário Marques
Bateria – Pedro Almeida
Depois de um sample narrar um monólogo e os sons de feedback e transmissões de rádio estranhas, eles fizeram o set arrancar com “Madman”, uma viagem sonoro
à demência transurbana, muito semelhante à realidade, no meu sincero ponto de vista que tenho a cortesia de vos mostrar.
à demência transurbana, muito semelhante à realidade, no meu sincero ponto de vista que tenho a cortesia de vos mostrar.
A seguir, veio a “Purgatory”, uma música que começa logo a abrir, confiante e arrogante, embora depois acalme por um momento… Pensando que ia ficar por ali, há uma parte que eleva a música de novo, mas, ao fim de um tempo, ela estagna dando a sensação que não se vai a lado algum, tal e qual no purgatório… Não viram “Lost”? É parecido.
A Terceira, “Prog 3” começa com guitarras carregadas de flanger ou reverb, penso eu na minha ignorância. Uma melodia um pouco, mas, nada de todo melancólica, talvez por me fazer lembrar um pouco dos géneros: Ethereal Wave, Shoegaze e Dream Pop. À medida que a guitarra vai tecendo a paisagem, algo entre uma balada e uma fanfarra ascende, enquanto o vocalista cantando em clean narra, as atribulações da vida e a necessidade de superar obstáculos e é no auge que ela estoira, numa avalanche ou derrocada de rock… Mas, no final, ela acaba d’onde começou… É por isso que se chama “Prog 3”. Porque é a terceira música e porque é progressiva e tem 3 fases. Pelo menos, no meu ponto de vista.
A quarta “Balada”, é embalada com um wah-wah romântico… A música corre como um passeio no parque. Lembra-me Eu às vezes, ingénuo, quando sofria em busca do amor na minha teen angst. Se forem sensíveis como a minha pessoa, ela vai-vos partir o coração no final… Ouçam, vale a pena sofrer um pedaço, em nome da beleza. Antes, que me abstraia nas teias do romance, avancemos para a quinta, “Jeff”.
Eu perguntei ao guitarrista se tinha algo a ver com o célebre Jeff Buckley, e Fernando, sorrindo afirmou que sim, dizendo também que a ideia surgiu mais da parte da banda, por causa da influencia que o guitarrista tem pelo artista mencionado. Tudo começa com um cowbell, com uma cadência mais acelerada, uma linha de baixo mais andante e vai progredindo assim, até descender num moody breakdown até esta divagar no espaço tempo, talvez ainda em busca do falecido Jeff…
Sexta, é “Frank”. Aqui uma batida mais desinibida, talvez, mais descontraída relaxa a atmosfera, onde um baixo a marcar oitavas faz o pessoal pular. É um baile e confesso qu’esta tirou-me da cadeira. Com uma sonoridade que se intercepta entre o rock indie e até mesmo pós-punque. Mas, o sujeito póetico da cantiga, deve ser bipolar. A descontracção termina em surtos de rebeldia, mais voláteis e o vocalista faz o obséquio de mostrar com uma voz mais severa e áspera. Se esta faixa tem uma história, na minha perspectiva, é de Frank, em busca de si mesmo. A rotina, ou até mesmo o círculo vicioso entre a estabilidade e o caos existencial que o mesmo tenta escapar. E talvez não consegue…
Pois, a sétima é “Triggered”. Aqui a batida é westerner ou ocidental se preferirem, com uma conversa entre o bombo e a tarola, enquanto a guitarra lança bends com uso de whammybar, devaneios de alguém que possivelmente esconde algum desdém por algo ou alguém, enquanto um baixo sorrateiro, faz este cadáver esquisito cambalear… Fez-me lembrar a minha fase favorita de Muse e até mesmo uma banda que raramente revelo na minha palete de gostos, por estar um pouco fora do meu espectro habitual, os Kaiser Chiefs. Mas, esta, acaba por ser mais lenta do que era suposto. E a guitarra indisciplina compensa, esse languescente tormento, duma forma intensa. E há medida que o puzzle vai-se compondo, cada vez mais elementos a serem adicionados na receita, Eu começo-me a lembrar das coisas que me fazem ficar triggered. As pequenas, depois as grandes, depois vem o silêncio… Implosão, ou explosão, é a questão que soa na minha cabeça e é aí que cada um faz o seu próprio julgamento. Ficaste triggered, ou não? Eu não sei… É por isso que estou a escrever esta review.
E como a vida é um vai e vem… Assim eles deram a sua filosofia de bolso, em “Waves” na oitava. Linda música, digo-vos já… A forma como a batida enrola e cumpre o seu propósito. A guitarra tece os pássaros a voar no céu e o baixo, a suave e fina areia debaixo dos meus pés. Com estes riffs dreamy, fazem-me lembra um belo passeio na praia, apesar d’eu não ser muito para aí virado.
A nona “sinfonia” de Fourtosix tem o nome de “Scars”. A percussão não perde tempo e começa a desconstruir o tema, até um riff de guitarra meio “punk” meter-se no meio, levar uma achega do baixo e uma ferida se abrir. Esta acaba por ser mais dinâmica, com o processo todo de cicatrização. Para finalizar a primeira parte deste bonito Gig, Fourtosix fecharam o seu acto, com “Country”.
A décima, Fernando que me surpreendeu imenso como guitarrista (e eu não tenho hábito de fazer estas referências tão pessoais) deu-nos o seu toque rústico musical e aí o tamborim junta-se à festa, num baile provinciano, mas, com muito gosto, digo-vos já. Aqui o baixo caminha na rua, mais que tranquilo, enquanto a guitarra o segue traquina por trás dele, mas, é uma cilada. No auge, a cadência acelera e é aí que o baile pára e a lida começa. Mostrando que a vida do campo nem é assim para todos… Humilde e cheia de paz, mas, com um enorme esforço e sacrifício em nome da terra.
= // =
Parte II – Sun Mammoth
© Iolanda Pereira / Sun Mammuth |
Guitarra – Nuno Henriques
Baixo – Carlos Cafi Sousa
Percussão – David Sena
Trinta minutos depois da meia noite, Eles chegaram e ficaram até há uma e um quarto. E mostraram-nos que nem tudo é o que parece. Nem todos os mamutes morreram na idade do gelo. Este, encontrou o caminho até ao nosso quotidiano. Avançando lento, mas cheio de força. Este stoner rock instrumental, como uns definem, mostra que nem todos, devem ser postos no meu saco. Eu digo, isto, porque sinceramente, estou cansado da saturação deste género. Sem querer dar hijack nas vossas consciências, corrijam-me se estiver errado. Há muito stoner (Eu sou um deles), mas, muito, pouco rock. E aqui este trio que sofreu uma alteração, o novo baterista que se juntou à tríade. Veio devolver o equilibro à equação. E mostrar um horizonte, onde o céu e o cosmos. São uno.
O primeiro selo, começa com “Evocation I”. Poético, eu gosto dos nomes que dão as músicas, parecem eu. Mas, sem perder tempo. Esta bonita malha, começa com uma conversa entre baixo e guitarra. O baixo pergunta a guitarra como vai o dia e ela começa a tentar simplificar-se, sendo breve, mas, a cadência inicia-se e ela começa divagar. Agora com uma base estável, uma boa sinergia entre ritmo e baixo ela sem inseguranças narra o que sente. Por onde tem ido, o que tem feito, por onde vai. E quando ganha no final a confiança que necessita, ela levanta-se da cadeira e agora o trio, conversa ao balcão e brindando ocasionalmente com um “Crash Cymbal” que se faz ouvir quando um shot bate na mesa. Eles vão bebendo, neste caso, nós o público é que fazíamos isso por eles. O álcool deixa-os mais rudes, mas, sem perder as maneiras, eles desabotoam a camisa e falam o que têm a dizer. Sem (vocês sabem à palavra qu’eu me refiro).
O segundo selo, tem o mesmo nome embora seja a segunda parte da encantação. Este mamute é tão poderoso, que precisa de duas evocações. Não é para todos. Aqui conseguimos ver já o mamute a ganhar forma, antes, só o víamos o tecido do espaço tempo a abrir. É nesta parte que vemos a magia do stoner rock, a parte mais psicadélica, neste caso, para eles, mais instrumental… Aqui temos uma vista para o passado, para as paisagens da era gelada. Os nevões que cobriram o passado para sempre, deixando um senso de curiosidade e fascínio. Um imaginário para deleitar na cabeça de cada um… Quando os elementos, a natureza reinava sobre tudo… E as criaturas, seguiam o curso dos eventos.
O terceiro rugido do mamute, é feito em “Marble”. Aqui, a guitarra aproxima-se de longe, enquanto os timbalões anunciam a sua viagem. O baixo, subtil apanha boleia e quando se dá por si, o ritmo perde o controlo e surge uma colisão sonora entre os três.
Em “The Gaze”, a terra estremece e uma linha de baixo guia uma manada de mamutes desalmados que correm ao som de tambores primitivos. A guitarra cria distorções no ambiente do quanto calor está neste dimensão sonora. Aqui um olhar sofrido, embora cheio de esperança, se arrebata no horizonte. Talvez, seja o desejo de ir mais adiante. Da saudade já antecipada, embora cheia de desejo de aventura.
E é caminhando para o infinito que o mamute do sol, vai… Desbravando esse trilho incerto, em busca do destino que avista de longe. Mas, essa curiosidade nunca chega a ser saciada. Se o fenómeno wanderlust soasse a algo, seria a “The Gaze”…
Ir só por ir…
E é caminhando para o infinito que o mamute do sol, vai… Desbravando esse trilho incerto, em busca do destino que avista de longe. Mas, essa curiosidade nunca chega a ser saciada. Se o fenómeno wanderlust soasse a algo, seria a “The Gaze”…
Ir só por ir…
Em “Sibir” escutamos uma malha que gosta de seduzir. Esta, sendo mais upbeat e menos intimista que as suas irmãs. Apesar de doce e extrovertida quando está calada, é mau presságio, pois isso significa que vai perder a cabeça. E é quando isso acontece que um baixo robusto abala a sua consciência e faz a sua demência falar em riffs de guitarra sofridos, confusos e até mesmo estranhos. Um conselho, tenham calma com esta “menina”, pois não é o que parece.
No seu registo oficial, Sun Mammuth declara o sexta tema da noite, com “Terlamonte”. E é aqui, que o seu trunfo é lançado. Ao contrário das outras, esta´é mais agressiva e directa. Não precisa de apresentações. Aqui, o desejo de ascender e a vontade de ver o monte escalado é profundamente notável no seu trabalho. Mas, este trio é diferente dos outros. Eles não se querem ficar por lá. Eles têm uma perspectiva diferente! E é no auge do pináculo, que a forma de pensar muda, quando a música é lançada do cume, como é hábito de acontecer nas paisagens onde o stoner rock, clama como seu domínio. E é nessa queda livre que o delírio ou até mesmo a euforia d’uma gravidade que nos puxa para baixo, em que certas fracções parece que o tempo pára. Mas, isso é só uma ilusão. Pois quando essa pedra robusta encontra superfície, ressalta ainda com mais poder. Uma derradeira força da natureza que rola pelo Terlamonte abaixo e devasta tudo no seu caminho.
Para terminar, Sun Mammuth prestaram um tributo a “Tweety – Karma 2 Burn”. Como espécie de digestivo, ou sobremesa para alguns.
Texto: Milton Matoso