Callaz em entrevista: “Gostava de conseguir ser mais ousada”

Callaz em entrevista: “Gostava de conseguir ser mais ousada”

| Fevereiro 21, 2021 5:36 pm

Callaz em entrevista: “Gostava de conseguir ser mais ousada”

| Fevereiro 21, 2021 5:36 pm

© Marta Costa

A música de Maria Soromenho diz Callaz à frente, pseudónimo com o qual assina o seu percurso artístico desde 2017. Aprendeu a misturar sons sozinha, dando à sua linguagem musical o barulho de fundo próprio da autonomia, uma preferência por um processo de trabalho guiado pela filosofia DIY.

Dead Flowers & Cat Piss é o mais recente trabalho de Callaz, gravado no verão passado com a ajuda de Helena Fagundes (Vaiapraia e As Rainhas do Baile, Clementine, entre outros), a sua estreia na produção musical. As canções foram escritas após o lançamento do primeiro LP homónimo (fevereiro de 2020), antes, durante e depois da quarentena, inspiradas por livros, filmes, histórias vividas, contadas e imaginadas. 

Numa conversa em registo eletrónico, falámos com Maria Soromenho sobre a origem de Callaz e as principais inspirações e referências, o processo de escrita de canções nas mais variadas línguas, os instrumentos utilizados na composição do novo álbum, entre outras temáticas. Fiquem com a entrevista completa, disponível em baixo.

 

Em primeiro lugar, como surgiu o nome Callaz?

Callaz – Gosto muito da Maria Callas. Lembro-me de ser mesmo muito pequena e estar meio fascinada com ela. Penso que tenha sido a minha mãe a falar-me dela e a mostrar a sua música. Quando estava a começar o projeto, ouvi a Norma cantada por ela e foi instintiva a ideia de utilizar o Callas mudando o “s” para “z” (o meu primeiro nome é Maria). 

O teu universo estilístico está associado ao mundo da música, tanto como Styling Assistant de várias artistas conceituadas, como na marca Maria Soromenho, projecto de criação de roupa e lenços de seda. Conta-nos como foi a primeira vez em que realmente tiveste essa consciência e oportunidade de começar a fazer a tua música. 

Callaz – Em 2016 tinha a minha marca Maria Soromenho e estava a morar em Los Angeles. Um amigo  perguntou se queria cantar em português numa música dele. Fomos para o estúdio (Lollipop Records), e gravámos a música. Foi a partir desse dia que comecei mesmo a ponderar a ideia de começar a fazer a minha própria música. No ano seguinte voltei para Lisboa e peguei no Casio que tinha comprado quando tinha 10 anos. Imprimi uma folha com os acordes (não tenho educação musical) e comecei a experimentar enquanto escrevia letras. 

Capa de Dead Flowers & Cat Piss

O que pretendes transmitir com Dead Flowers & Cat Piss?  

Callaz – Dead Flowers & Cat Piss pretende dar um efeito de sequela/espelho ao título do meu primeiro EP, composto também por um conjunto de elementos “semelhantes” (Beer, Dog Shit & Chanel No5).

Comparativamente ao disco de estreia homónimo de 2020, Dead Flowers & Cat Piss soa-nos mais ousado, instrospetivo, repleto de arranjos experimentais. O que sentes que mudou neste tão curto espaço de tempo entre estes dois trabalhos? 

Callaz – Este disco foi escrito durante o primeiro confinamento, acabando por torná-lo mais introspectivo que os trabalhos anteriores. Tenho sempre o objetivo de explorar/experimentar mais e penso ter começado a fazê-lo um pouco nalguns arranjos e na voz, mas ainda gostava de conseguir ser mais ousada. A mudança global de 2019 para 2020 foi drástica e penso que em mim talvez se tenha refletido na música. 

Podes-nos contar como foi trabalhar com a Helena Fagundes na produção de Dead Flowers & Cat Piss?

Callaz – Foi muito bom e fácil trabalhar com a Lena. Ela é muito talentosa, tem uma ética de trabalho impecável e vontade de compreender e respeitar a ideia inicial do músico, para que a produção a realce mas mantenha. 

Falando novamente em colaborações, qual seria para ti o artista de sonho com quem gostarias de colaborar?

Callaz – Não sei bem, mas provavelmente alguém que saiba muito sobre música não ocidental. 

Callaz é um projeto que tem adotado essencialmente uma postura DIY ao longo das várias edições, uma vez que até aprendeste a misturar sozinha. Que instrumentos é que foram utilizados na construção deste disco? 

Callaz – Para as demos utilizei Casios e alguns pedais, o Garageband e samples. O disco foi feito num estúdio caseiro e além do microKORG, utilizámos sons de synth em midi e muitas camadas de sintetizadores emulados no software Pro-Tools. Utilizámos também algumas samples e as baterias foram feitas no software Hydrogen, num sample pad e na drum machine Korg Volca Beats. Em algumas músicas a Lena tocou baixo, guitarra e xilofone e depois trabalhou com efeitos na pós-produçao.

Podemos ficar a saber quais são as principais referências musicais de Callaz?

Callaz – Oiço muita música e variada e gostava de não ficar demasiado presa à musica que mais gosto mas no início do projeto as referências fundamentais foram Young Marble Giants, Cristina, The Space Lady, Marine Girls, Velvet Underground, Nico, Suicide, The Raincoats

As letras que compõe este disco dividem-se entre a língua portuguesa, a inglesa e a francesa. Como é que funciona o teu processo de escrita de canções?

Callaz – Costumo escrever e ler nas três línguas. Quando oiço ou penso algo de que gosto da sonoridade costumo apontar no meu caderno. Quando vou escrever, às vezes acabo por fazer uma colagem de várias coisas que apontei antes. O processo mudou de música para música mas raramente escrevo uma letra de seguida. Conforme vou criando a música, vou “moldando” a letra.

© Marta Costa

O tema “Aghast” é um dos maiores destaques de Dead Flowers & Cat Piss. Podes-nos falar um pouco sobre ele?

Callaz – Sempre gostei da cena em que Ginger Rogers e Fred Astaire representam a música “Pick Yourself Up no Swing Time” (1936). Utilizei aqui a minha parte da letra preferida (“I pick myself up, dust myself off, start all over again”). A demo tinha inicialmente 3 minutos e foi ideia da Lena prolongá-la e adaptá-la à ‘pista de dança’. A outra parte da letra é inspirada numa história de Cleopatra (pearls in wine) onde esta esmaga uma das suas pérolas em vinho e bebe-o, ganhando assim uma aposta a Marco António. 

Já atuaste em diversos países europeus e até tiveste direito a uma digressão em Nova Iorque. Em que sala de concertos é que gostarias mesmo de tocar e ainda não tiveste oportunidade de o fazer?

Callaz – Tenho tantas saudades de concertos que qualquer sala serve para mim neste momento 🙂 

Como é que te ocupaste na quarentena? Dirias que o confinamento foi produtivo?

Callaz – O primeiro sim, este está a ser muito mais complicado por várias razōes mas o objetivo é conseguir não desanimar. Não me faltam coisas para fazer…

Relativamente a planos para o futuro, há algo que nos possas adiantar?

Callaz – Estou a criar novas músicas que quero conseguir gravar este ano, mas ainda não tenho planos concretos. 

Para finalizar a entrevista, podemos saber que artistas e bandas tens escutados nos últimos tempos?

Callaz – Aretha Franklin, Nino de Elche, Chick Corea, Gazelle Twin, Jlin, Saul Williams, Vivaldi: The Four Seasons do Nigel Kennedy, Catherine Ribeiro, Sudan Archives, This Heat, Akaba Man, canto ortodoxo Russo, Gregoriano, entre outros! 


Dead Flowers & Cat Piss saiu na passada sexta-feira (19 de fevereiro) e pode ser escutado na íntegra em baixo.

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