PEACHFUZZ em entrevista: “O nome que mais se falou nesses dias foi Sun Ra, mas ainda assim não tentámos seguir uma estética”

PEACHFUZZ em entrevista: “O nome que mais se falou nesses dias foi Sun Ra, mas ainda assim não tentámos seguir uma estética”

| Fevereiro 25, 2022 1:45 pm

PEACHFUZZ em entrevista: “O nome que mais se falou nesses dias foi Sun Ra, mas ainda assim não tentámos seguir uma estética”

| Fevereiro 25, 2022 1:45 pm

O jazz nacional atravessa um belo estado de graça, nomeadamente em Lisboa com o constante aparecimento de novos projetos criativos a surgir em catadupa de jovens artistas com uma enormidade de talento e qualidade, sendo uns caracterizados por um som mais delineado ou pensado, e outros que teimam em fugir aos padrões tradicionais do jazz. 

Os PEACHFUZZ são formados por João Almeida no trompete, Norberto Lobo na guitarra elétrica e João Pereira na bateria decidiram reunirem-se para dar asas à imaginação e pôr mãos à obra para lançarem ao dia de hoje o seu álbum de estreia “Peachinguinha” com o selo da editora belga Silent Water Records.

Todos eles são o retrato da atual cena jazz que ocorre na capital ao estarem inseridos em diferentes projetos, partilhando inclusive palco com artistas de renome nacional e internacional como o saxofonista português Ricardo Toscano e o trompetista nova-iorquino Peter Evans.

Estivemos à conversa com o trompetista João Almeida para compreender as influências deste novo trio que explora um som não convencional e inovador, onde quem manda é o movimento improvisado e a liberdade total do avant-garde sobre os seus instrumentos.

Qual é a história que originou este vosso nome PEACHFUZZ? 

O nome surgiu através do Norberto, de onde veio não sei, mas concordámos todos no momento em que ele o partilhou connosco.

Como descreveriam o vosso álbum de estreia? 

Acho que podemos descrever o nosso álbum como música criativa e livre.

Estando a vossa formação inteiramente ligada ao estudo do jazz, com o facto curioso de alguns elementos do trio terem percursos semelhantes ao terem estudado na Luiz-Villas Boas Jazz School e na Escola Superior de Música de Lisboa. Imagino que se tenham cruzado inúmeras vezes por esses corredores, portanto queria compreender se essa conjugação de fatores tornou este disco especial para vocês por terem tantos pontos em comum ao experienciarem todos o mesmo meio artístico e criativo? 

Engraçado dizeres isso, porque só nos conhecemos depois desse percurso. Eu conheci o João Pereira (baterista) nas várias jam sessions que acontecem na cena musical lisboeta e o Norberto foi-me apresentado pelo trompetista Yaw Tembe, no contexto da banda Chão Maior. Acho que o que tornou o disco especial foi o contexto em que o gravámos. Quando decidi juntar esta banda, já sabia à partida que a música iria funcionar – por os conhecer a ambos e saber que já conheciam o trabalho um do outro – quando surgiu a ideia de gravar o disco, o Norberto sugeriu irmos para o Alentejo, para um casa de família, e foi nesse período de 4 dias que o disco foi gravado. 

Ao escutar o vosso álbum sobressai o facto de haver um som bastante conectado à improvisação livre, logo a abrir com a empolgante “Peaches Brew” que transporta-nos imediatamente para o período elétrico do Miles Davis e gostava de compreender se essas referências foram algo que pensaram durante o vosso processo criativo? Existem outras inspirações musicais, literárias ou experiências pessoais que tenham tido impacto na concepção do disco? 

Acho que as referências estão lá sim, e são muito importantes, mas não as usamos como fonte de inspiração. É música que ouvimos e conhecemos bem, mas não pensámos que a nossa música viria desse ponto de partida, simplesmente pusemos a gravar e tocamos. O nome que mais se falou nesses dias foi Sun Ra, mas ainda assim não tentámos seguir uma estética.

O trompetista João Almeida e o guitarrista Norberto Lobo partilham outros projetos musicais, como é o caso do sexteto dos Chão Maior. De que forma é que essa proximidade vos ajudou e de que maneira se diferencia no processo de composição com os PEACHFUZZ?

Foi nos Chão Maior que nos conhecemos, e ao fim de uns concertos mostrámos interesse (um ao outro) de que queríamos trabalhar juntos fora de Chão. Na verdade, através dos Chão Maior surgiram mais 3 ou 4 bandas como é o exemplo de PEACHFUZZ e agora de Fumo Ninja. Em termos do processo de composição, em Chão Maior a música é escrita pelo Yaw Tembe, enquanto que em PEACHFUZZ a música é totalmente improvisada.

Apesar de ainda não terem lançado o disco, reparei que já tiveram a oportunidade de realizar vários concertos nos últimos meses, onde convidaram em outubro de 2021 o percussionista Jerry, The Cat para se juntar ao vosso trio  no concerto que deram na Igreja Espírito do Santo das Caldas da Rainha. Têm em mente dar continuidade a esse tipo de colaborações em atuações ao vivo ou até mesmo em discos com outros artistas do jazz nacional ou internacional no futuro? 

Se surgir a oportunidade sim, depois do concerto com o Jerry, tivemos a oportunidade de receber o contrabaixista norte-americano, Brandon Lopez, para um concerto na ZDB. Outro nome que tem surgido em conversas nos últimos tempos é o saxofonista japonês Akira Sakata. A ver se acontece.

Como é que sentem que está o circuito do jazz nacional atualmente e também qual a vossa opinião acerca do estado da música dita improvisada? 

Sinto que o circuito do jazz nacional está cada vez mais variado, existem cada vez mais músicos a fazer coisas diferentes e acho que isso é ótimo e necessário para a evolução desta música. Seria de esperar que com este crescimento e desenvolvimento de profissionais das artes (não só na música, claro) viesse também o aparecimento de mais espaços para os receber, mas infelizmente não é o caso.

E a nível internacional sentem-se influenciados ou inspirados por esta atmosfera entusiasmante gerada por esta nova vaga de jovens músicos do jazz que está a acontecer em vários pontos do mundo como no Reino Unido, EUA e na Austrália? 

Não diria que é esse o caso, diria que a maioria das nossas influências vêm de outros géneros musicais.

Que ambições planeiam para o futuro do projeto e têm datas que possam adiantar para concertos?

Para este projecto idealizámos lançar um ou dois discos por ano, já temos alguns arquivados há espera de interesse de editoras, e para além disso tocar o mais possível, em Portugal e no resto da Europa, se for possível.

Para já temos três datas de apresentação do álbum – 21 de Abril no Werkplaats Walter em Bruxelas, Bélgica, 5 de Maio no Musicbox em Lisboa e 21 de Maio na Casa da Cultura em Setúbal.

Fotografia: Lara Maia 

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