Dakoi em entrevista: “MASTIGA foi o meu processo de crescer enquanto pessoa e crescer na música”
Dakoi em entrevista: “MASTIGA foi o meu processo de crescer enquanto pessoa e crescer na música”
Dakoi em entrevista: “MASTIGA foi o meu processo de crescer enquanto pessoa e crescer na música”
#queer #electronic #CLUB #HARD DRUM. São estas as tags que podemos encontrar no Bandcamp associadas a MASTIGA, o EP de estreia de Dakoi, a persona criativa de Tanya Caldeira. DJ e produtora oriunda de Leiria, mas agora a viver em Lisboa, responsável pelas festas lésbicas e queer LIBIDA, Dakoi decidiu partilhar os seus últimos anos de composição e os ritmos que foi criando nos quartos de várias casas por onde passou.
Ainda que seja o primeiro registo em nome próprio, a produtora soma já uma vasta experiência, tendo contribuído para compilações de editoras como Mãe Solteira Records e Weathervane Records, deixando também a sua marca em remisturas de temas de Odete e ARCANA. Em MASTIGA, Dakoi transporta-nos por “vários sentimentos e fases diferentes da sua vida”, enquanto simultaneamente “questiona e tenta arranjar forma de lidar com a perda, de amizades e de amores”. A obra altamente catártica culmina na libertação e auto-reconhecimento.
Para nos falar sobre o EP de estreia editado em junho e o panorama de representatividade queer na música eletrónica nacional temos connosco Dakoi.
Para começar esta entrevista, gostavámos de ficar a conhecer um pouco melhor o teu passado musical. Atuas como DJ, és responsável pela LIBIDA, uma festa voltada para a comunidade lésbica/queer, e estás ainda envolvida na organização do Festival Impulso. O que te levou a querer seguir a via da composição e produção?
Na verdade a composição e produção estão há mais tempo na minha vida do que o resto (risos), só demorei imensos anos a sentir a coisa mais sólida ou a querer assumir e lançar. Eu sou apaixonada por música e sempre quis fazer música, produzir foi a forma de eu conseguir realizar sozinha o sonho que tinha em teenager, que era ter uma banda, porque tocava guitarra e seguia bué as bandas de hardcore/ metalcore (risos).
Tens estado bastante ativa nos últimos anos com faixas lançadas em diversas compilações – Mãe Solteira, Weathervane Records e circa A.D. Consideras que existiu algum momento que te deu o ímpeto para te estreares com MASTIGA?
Eu estou para lançar a MASTIGA desde 2020, quando a Filipa Combo começou a trabalhar comigo. Era para lançar por uma label, e nunca mais aconteceu porque adiei infinitamente até agora, por não estar preparada para assumir o projeto, ou por causa do mix e do master, ou por outro motivo qualquer. O EP era para só ter 2 músicas mas foi sofrendo transformações durante estes anos, até ser o que é hoje. O EP acompanhou e foi o processo emocional da saída da adolescência e inicio dos meus 20’s basicamente.
Podes explicar um pouco do conceito por detrás de MASTIGA e a mensagem que pretendes transmitir?
MASTIGA é um EP muito pessoal, foi o meu processo de anos, de crescer enquanto pessoa e crescer na música. Lidar com inseguranças, lidar com perdas de amor e de amizade nesse caminho em busca da felicidade e da paz, a fazer o que gosto e ter coragem de assumir que estou a fazer o que gosto e estou a aprender ainda e, por isso, permitir-me a errar, errar em praça pública, não só no quarto a fazer beats.
Finalmente estar out era o que precisava para continuar a assumir os meus erros no processo de crescimento, um bocado a superação desses altos e baixos e uma conquista para mim própria. Tive muito tempo a não me permitir errar em público porque “ai este som não é perfeito, ainda não tá bom assim”. Já queria ser perfeita na minha própria concepção de perfeição e ser boa a fazer no que faço mas isso não existe. Nunca vou chegar à perfeição. Parece uma coisa bué simples mas não é às vezes. Agora estou ready para lançar mais coisas não perfeitas, aceitar e descobrir mais no processo. Estou a trabalhar em coisas novas bué fixes este ano e quero bué mostrar a toda a gente.
Quando uma ideia surge na tua mente, como encontras o método adequado para transformá-la numa música? O que é que te guia na decisão de adicionar elementos específicos à composição?
O meu processo mudou imenso nestes anos todos a tentar fazer beats. Eu faço field recordings e a maioria dos samples que se ouvem nos beats vêm a partir dessa recolha de sons. Tenho uma biblioteca de sons desde o segundo ano que morava nas Caldas. Para aí nessa altura comprei um gravador e ia para a SECLA (Fábrica de Cerâmica abandonada) gravar. Depois tentava juntar esses sons mais industriais e plásticos de uma maneira experimental/deconstructed, que era o que eu tava bué in love por na altura, tipo a música que saiu na compilação da CIRCA A.D e o remix “B WITH U” que fiz para o álbum da Odete em 2019.
A minha maneira de trabalhar e referências foram mudando, fui trazendo um bocado mais de ritmo/ loop aos meus beats e de uma maneira mais “pop”, usando o meus samples à mesma mas com influências mais reggaeton/trap/techno/funk brasileiro. As coisas naturalmente foram mudando mas o meu workflow é o mesmo, é muito corta e cola no ableton, muito cru, eu gosto de trabalhar assim.
O que ando a trabalhar e o que me faz encontrar o momento de começar a trabalhar numa música agora é a escrita, um tema, fico tipo “preciso de falar sobre isto” e escrevo, ou vou escrevendo sempre notas, todos ou quase todos os dias, para possíveis letras. Foi isso que mudou este ano. Eu antes era só produtora, agora escrevo e uso a voz, que era o que eu queria, queria muito sentir-me confortável com a escrita e com a voz e isso foi um processo de imensos anos.
Falando de “Fenda”, a faixa que abre MASTIGA, parece estar mergulhada num universo de angústia e mágoa, mas ao mesmo tempo tem a capacidade de se expressar como um momento de catarse e purificação. Podes nos falar um pouco mais sobre ela?
A “fenda” é uma música de break up. Como boa scorpio que sou faço músicas de breakup (risos). Como foi contar com o contributo de DIANA XL na mistura e masterização de MASTIGA?
Eu confio bué no trabalho da Diana, vimo-nos a crescer uma a outra na música e somos amigas. A quarentena separou-nos um bocado assim como me separou de várias pessoas. Normal, foi o contexto, e foi engraçado que na quarentena fizemos uma chamada de zoom para ela me dar dicas à distância de mix e master, mas o EP não ficou fechado aí e também não era o que é hoje, nem tinha o mesmo número de músicas como tem hoje, como tinha dito antes, o projeto sofreu bué alterações. Este ano vim morar para Lisboa, voltámos a dar-nos mais e ela ofereceu-se para me ajudar a fechar o projeto para ser lançado este ano e assim foi. Obrigada, Diana.
No contexto da cena musical eletrónica nacional e na esfera em que estás inserida, há alguém por quem te sintas influenciada e gostarias de destacar?
Ya, isso está sempre a mudar porque eu tenho bué fases e eu sigo bué a cena underground de Lisboa. Tenho bué amigues producers/vocalistas que me inspiram e os que são a inspiração mais presente agora são Diana XL, Bleach Mane, Yū, Aires, Allian e Bejaflor.
Sendo a tua música catalogada como queer, sentes que existe representatividade suficiente na música eletrónica nacional? O que pode ser feito no sentido de se reconhecer e incentivar mais artistas queer?
Eu não consigo motivar ninguém a ser artista em Portugal. É horrível e torturante (risos). Acho que o panorama musical queer já teve melhor dias, não há muitas oportunidades para ocupar espaços. Está toda a gente a tentar com todas as armas que tem para fazer acontecer e nenhuma montanha se move. Está a ser um ano complicado e eu acredito que há mal que vem por bem. Ao menos sinto que é um ano de reconstrução na música nacional e só posso esperar que as coisas melhorem para toda a gente. Andamos sempre na mesma luta em Portugal, ou seja, se é um país que não valoriza cultura e já é difícil para toda a gente no geral, pior é para minorias sempre.
Como tem sido a receção do público em relação a MASTIGA? Há datas de apresentação que nos possas adiantar? Soubemos de uma com local secreto… podes falar-nos sobre isso?
O local secreto era num spot do Porto, uma rave secret location, a localização só foi anunciada no próprio dia à noite. Correu bué bem, já não tocava numa rave assim há bué tempo. Gosto sempre de tocar nestes sítios e ser convidade por teams que criam raves assim underground, é especial. Dia 29 de Julho foi nos Maus Hábitos a convite das cutie M3DUSA, gosto muito delas, foi bué fun.
E para Setembro, dia 8, vou voltar com a ENAMORA, a minha festa para a MUSA de Marvila, convidei um DJ muito referência, DJ Maboku, tou bué excited e quero bué partilhar com vocês!