Tal como nos dois anos precedentes, em junho lá estaremos em Leipzig, na Alemanha, para celebrar o Pentecostes. Mas a nossa celebração pouco tem de religioso. É antes um ritual que já se entranhou e que custa a largar. Wave Gotik Treffen

Entre os dias 6 e 9 de junho, Leipzig veste-se de negro para receber o Wave-Gotik-Treffen (WGT), o maior festival gótico do mundo. Mas o WGT é mais do que um festival de música – é uma peregrinação, um reencontro, um regresso a casa para milhares de almas que ali encontram um espaço de expressão, liberdade e partilha. Durante quatro dias, a cidade transforma-se num palco vivo onde milhares de aficionados de uma subcultura, muitas vezes mal percebida e repleta de estereótipos, se (re)encontram.

Com mais de 200 concertos espalhados por cerca de 20 locais um pouco por toda a cidade, o cartaz do WGT abrange um vasto espectro musical: do darkwave ao neofolk, do industrial ao post-punk, passando por sonoridades medievais. Este ano, como é habitual, a programação promete agradar tanto aos veteranos do festival como aos novatos em busca de descobertas. Nomes lendários como London After Midnight, The Nosferatu ou Vomito Negro (e estas são apenas algumas das mais de 150 bandas confirmadas até ao momento) regressam para provar que continuam a moldar a cena, enquanto bandas emergentes trazem uma nova energia ao evento.

Gotminister

Mas o festival não se resume apenas à música. Para quem quer mergulhar a fundo na estética e na história do universo gótico, há leituras, exposições, mercados alternativos e outras atividades. Coisas tão díspares como uma prova de atletismo para góticos ou um desfile de carros funerários, que parte do centro da cidade e termina no Südfriedhof, um dos mais fantásticos cemitérios que já tivemos oportunidade de visitar.

Um dos eventos imperdíveis é o Piquenique Vitoriano, realizado sempre na sexta-feira à tarde no Clara-Zetkin Park, onde corpetes, espartilhos, rendas e cartolas tomam conta da paisagem, criando um cenário digno de um quadro romântico. É a oportunidade perfeita para entrar noutra era, onde a elegância e o mistério se fundem de forma sublime. Fotógrafos e curiosos reúnem-se para testemunhar os trajes intricados e a atmosfera quase onírica deste encontro. No dia seguinte, outro dos jardins da cidade acolhe o piquenique do Steampunk, e novamente visitantes, curiosos e muitos fotógrafos marcam presença para assistir a mais um espetáculo imperdível.

O WGT é um espaço de diversidade e de tolerância. Não tendo uma componente religiosa que seja uma marca identitária desta subcultura, é habitual realizar-se uma missa para góticos cristãos numa das muitas igrejas da cidade. Mais um exemplo da diversidade de atividades que marcam este festival.

Entretanto, durante os dias do WGT, há diversos locais e clubes que prolongam a festa noite dentro (os concertos do festival costumam terminar cedo). Para quem gosta de viver a festa até de manhã, não faltarão opções que servirão todos os gostos musicais, desde o EBM, Synth, Gothic Rock, Darkwave e demais géneros e subgéneros da cena.

A cidade de Leipzig, com o seu charme histórico e espírito aberto, acolhe o festival como poucos locais poderiam fazê-lo. A cidade é lindíssima e merece que se dedique algum tempo, especialmente da parte da manhã, quando ainda não há concertos, para visitar as suas praças, museus e observar a arquitetura dos edifícios históricos, alguns deles que, inclusivamente, recebem eventos do WGT. Os habitantes locais (a cidade tem cerca de 600.000) parecem entrar no espírito, trocando sorrisos cúmplices com os visitantes vestidos a rigor. O pedido de fotografias é um costume e já ninguém estranha, principalmente os que dedicam maior cuidado na escolha da indumentária que decidem trajar nos dias do festival, que são amiúde solicitados para posarem com desconhecidos que querem ficar com uma recordação daqueles dias.

O Agra Messepark, antigo centro de exposições do tempo em que Leipzig era uma das mais importantes cidades da extinta RDA, continua a ser o coração do festival, não só como recinto dos concertos com as maiores bandas, visto que é também o que maior capacidade tem, podendo acolher cerca de 8000 espetadores, mas também como um mercado vibrante onde os participantes podem explorar um vasto leque de moda gótica, acessórios artesanais, discos de vinil, CDs e memorabilia rara. Aqui, os festivaleiros podem mergulhar na estética da subcultura e descobrir peças únicas que refletem a sua identidade.

Para quem visita pela primeira vez o WGT, recomenda-se uma passagem pelo Heidnisches Dorf (vila pagã), uma viagem ao passado que nos leva diretamente para a época medieval. Aqui, pode-se experimentar outro tipo de nostalgia, passeando por bancas de madeira com produtos artesanais, assistindo a espetáculos de música folk e beber hidromel à sombra das árvores. É também aqui que poderão encontrar uma tenda daquela que foi durante anos uma referência na cidade de Leipzig: o Sixtina, bar de absinto que, entretanto, encerrou, mas que renasce na vila pagã durante os dias do festival. Em contraste com os sons eletrónicos modernos que dominam alguns palcos, o Heidnisches Dorf oferece uma experiência mais orgânica e enraizada, relembrando as origens das tradições góticas e folk, mas é também aqui que muitas das bandas mais ligadas ao metal marcam presença. Muitas delas misturam precisamente metal com folk, algo que não é tão estranho quanto possa parecer à primeira vista. Vale a pena passar por lá.

E se há algo que torna o WGT verdadeiramente especial, é essa sensação de pertença, de saber que existe um lugar onde se pode ser exatamente quem se é, sem julgamentos nem barreiras. Entre um concerto intenso no Agra, uma conversa fortuita num café ou uma dança despreocupada num dos clubes, há sempre momentos que fazem valer cada quilómetro percorrido até Leipzig. Porque, no final, o Wave-Gotik-Treffen não é apenas um festival – é um ritual, uma tradição, uma promessa de que, ano após ano, há sempre um lugar para voltar e ser feliz.

Caso alguém tenha ficado interessado em viajar até Leipzig para o WGT deste ano, ficam as recomendações do costume: apressem-se a marcar alojamento e viagem. Os preços, especialmente os do alojamento, disparam nesta altura do ano. É mais fácil conseguir alojamento a preço razoável quando se viaja em grupo, pois há apartamentos que são arrendados a preços convidativos e mais em conta que os dos hotéis, que inflacionam enormemente os preços das diárias nesta semana do festival.

Ao dia de hoje, há cerca de 150 bandas confirmadas. Mas, à semelhança dos anos anteriores, nas semanas que faltam até ao evento serão ainda anunciadas largas dezenas de outras. A dificuldade vai ser escolher e conseguir compatibilizá-las, pois muitos concertos ocorrem à mesma hora em locais diferentes da cidade. É uma questão de tomar opções, que nem sempre são fáceis dada a qualidade do cartaz.

Encontramo-nos em Leipzig! Aproveitem!

Bandas confirmadas para o WGT 2025:

A Cloud Of Ravens (USA) – Absurd Minds (D) – Alphaville (D) – Alvader (NL) – And Also The Trees (UK) – André Alabaster & The Curved Beaks (D) – Ann My Guard (NL) – Antibody (D) – Anything Box (USA) – Arthuan Rebis (I) – Ashram (I) – Aux Animaux (S) – Balduvian Bears (USA) European premiere – Basszilla (D) – Beborn Beton (D) – Black Nail Cabaret (H) – Blazing Eternity (DK) – Bleib Modern (D) – Blood Handsome (USA) – Calva Y Nada (D) Exclusively in Germany 2025 – Camouflage (D) – Centhron (D) – Chainreactor (D) – Christ Vs Warhol (USA) – Chrom (D) – Combichrist (USA/N) – Container 90 (S) – Coppelius (D) – Corlyx (UK) – Crimson Veil (UK) – Crooked Mouth (LT) – Cryo (S) – Cut Hands (UK) – Dark Ride (USA) – Darkways (E) – Death In Rome (AQ) – Deceits (USA) Germany premiere – Delva (D) – Deus Ex Lumina (ARG/D) – Diavol Strain (RCH) European premiere – Drab Majesty (USA) – Eisenfunk (D) – Escape With Romeo (D) – Eva O. (USA) – Faetooth (USA) – Fangs On Fur (USA) – Finntroll (FIN) – French Police (USA) – Funker Vogt (D) – Future Nobodies (USA) European premiere – Gernotshagen (D) – Grendel (NL) – Haggefugg (D) – Hallowed Hearts (USA) – Henric De La Cour (S) – Ianva (I) – Icon Of Coil (N) – In Mitra Medusa Inri (D) – Incirrina (GR) – Ingrimm (D) – Intent:Outtake (D) – Jakuzi (TR) – Janus (D) – Kalandra (N/S) – Kalt (F) – Kiss The Anus Of A Black Cat (B) exclusive Reunion / only concert 2025 – Kite (S) – Klangstabil (D) – Kupfergold (D) – Labyrinth Ear (UK) – Lakeside-X (CZ) – Letzte Instanz (D) – Liebknecht (D) – Linea Aspera (AUS/UK) – Linear Movement (B) – London After Midnight (USA) – Lone Assembly (CH) – Lovataraxx (F) – Lucas Lanthier`s Cinema Strange (USA) – Lucifer Star Machine (D) – L`Ame Immortelle (A) – Mad Sin (D) – Mars (D) – Midas Fall (UK) – Mila Mar (D) – Mode In Gliany (BZH) – Morphose (D) – Mythemia (D) – New Model Army (UK) – Night In Athens (UK) – Nim Vind (CDN) – Noisex (D) – Noisuf-X (D) – Nouvelle Vague (F) – Nytt Land (RUS) – Orange Sector (D) – Osi & The Jupiter (USA) – Ost+Front (D) – Patriarchy (USA) – Plastique Noir (BR) European premiere – Pouppee Fabrikk (S) Live Reunion – Protokoll 19 (USA) European premiere – Public Image Limited (UK) – QEK Junior (D) – Rabengott (D) – Resplandor (PE/NL) – Rhys Fulber (CDN) – Rue Oberkampf (D) – Ruined Conflict (USA) – S.I.T.D. (D) – Sad Madona (F) – Schneewittchen Im November (D) – Selofan (GR) – Shrouds (USA) – Silent Runners (NL) – Silke Bischoff (D) exclusive WGT concert – Sixth June (D/SRB) – Skelesys (D) – Skemer (B) – Skynd (AUS) – Soror Dolorosa (F) – Spetsnaz (S) – Stahlmann (D) – Sturle Dagsland (N) – Sturm Cafe (S) – Sweet Ermengarde (D) – The 69 Eyes (FIN) – The Exploding Boy (S) – The Invincible Spirit (D) exclusive 40th anniversary show with guests – The Masqs (USA) – The Membranes (UK) – The Nosferatu (UK) – The Sweet Kill (USA) European premiere – Then Comes Silence (S) – This Cold Night (USA) European premiere – Torul (SLO) – Totentanz Strumpfsockig (D) – Totus Gaudeo (D) – Tristwch Y Fenywod (GB) – Turquoise Days (UK) – Urban Heat (USA) – Vermaledeyt (D) – Veljanov (D) Best of – Special concert – Void Vision (USA) – Vomito Negro (B) – Vroudenspil (D) – VVV [TrippinYou] (E) – Whispers In The Shadow (A) – Xandria (D) – Xotox (D) – Zeraphine (D)

Texto e fotografia: Manuel Soares