GoGo Penguin
A Humdrum Star

| Março 9, 2018 11:30 am

A Humdrum Star // GoGo Penguin // fevereiro de 2018
8.0/10

A história do jazz é uma história de inovação – a viagem descrita pelo género incorpora de tudo um pouco, desde folclore nos tempos da dixieland, rock com a génese do jazz fusion, a palavra e rap no advento do hip hop, até géneros mais “marginais” e esotéricos como free jazz e jazz espiritual. Contudo, algures no meio desta turbulência, houve ainda tempo de permitir que a manipulação electrónica da música (e a própria música electrónica) se infiltrassem num dos géneros mais camaleónicos da música.
O último trabalho dos GoGo Penguin é um exemplo catedrático dessa infiltração. Editado pela Blue Note – uma das editoras de jazz mais antigas e conceituadas, que assina/assinou gigantes do jazz como Cannonball Adderley, Tony Allen, Sidney Bechet, Art Blakey e Don Cherry (fico-me por aqui para não incorrer numa delonga desnecessária) – A Humdrum Star é o quarto álbum do trio de Manchester, que consegue inovar num mundo maravilhosamente saturado – é impossível esquecer que dentro do jazz continuam a ser produzidas obras de referência por nomes como Kamasi Washington e Flying Lotus (ficando-me por aqui, novamente, para não prolongar esta crítica para lá do aceitável).
A Humdrum Star não vai de encontro à ideia conservadora do jazz como um género difícil ou elitista – antes pelo contrário, encontra a sua voz em melodias que não têm medo de mostrar a sua faceta pop e em repetições categóricas de música de dança, com ritmos bem delineados onde o improviso característico do jazz tem apenas fôlego suficiente para desenhar pequenas flutuações que não escondem as estruturas de fácil audição de onde surgem. 
É difícil oferecer destaque a qualquer um dos temas – o disco mantém um nível geralmente alto, sendo a coesão um dos fatores que torna a sua audição numa experiência que não requer qualquer esforço. Contudo, há sempre momentos que sobressaem: Strid, um dos momentos de maior liberdade do álbum, assenta sobre um groove viciante e pouco ortodoxo que Nick Blacka, contrabaixista da banda, carrega até a um momento de maior expansão – um crescendo típico de post-rock sem se afirmar como isso. Transient State é um constante diálogo entre bateria e piano, protagonizados por Rob Turner e Chris Illingworth, sobre um tópico proclamado por um metrónomo-feito-contrabaixo – um ensaio sobre a democracia, uma “discussão” brilhante em que nenhuma voz se sobrepõe à outra.
Ainda no tópico dos destaques, é impossível não mencionar Raven – segunda faixa do disco, que começa por seguir a melancolia e inocuidade do tema de abertura, Prayer, para logo as deixar para trás numa inquietação e caos controlado que acaba por estar presente no resto de A Humdrum Star – ou Bardo, uma música que começa estranhamente próxima daquilo que pode ser considerado EDM mas que rapidamente se desprende desse rótulo, abrindo alas para um dos finais mais bem conseguidos do disco. 
Apesar dos GoGo Penguin não serem caras novas – levam quase 10 anos de carreira – continuam a soar a novo, não esquecendo o jazz de onde vêm nem o nu jazz onde estão. A Humdrum Star é um disco que pode ser ouvido em primeiro plano ou como personagem secundária (apesar de ser difícil de ignorar), mantendo-se interessante e chamativo desde o primeiro instante.
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