Brutus no Hard Club: o momento é deles, ouçam o seu grito vital.
Brutus no Hard Club: o momento é deles, ouçam o seu grito vital.
Brutus no Hard Club: o momento é deles, ouçam o seu grito vital.
Precisamente um ano depois de uma aclamada passagem pelo Amplifest, os Brutus regressaram a Portugal para aquilo que honestamente nos soou ao derradeiro momento de consagração. Que o hype em torno do trio belga é cada vez maior nem sequer ousamos questionar – a Sala 1 bem cheia que os acolheu nesta noite de segunda-feira é prova irrefutável dessa popularidade- , mas a energia vital que daqui emanava ilustrava algo mais, algo que pode ser descrito como a emoção que é ver uma banda no auge das suas capacidades a criar magia . Em fase de promoção ao mais recente Unison Life, os Brutus debitaram paixão do primeiro ao último minuto, deambulando entre o rasgo cru de um post-hardcore emotivo e a luminosidade de texturas post-rock tão enérgicas quanto etéreas que se deixam abraçar pela envolvência do shoegaze.
Espantosa máquina bem oleada, mostraram-se francamente mais pujantes e intensos que no Amplifest, como se o “fogo” dentro deles ardesse agora com mais força. É que se essa atuação, para nós, foi “só” agradável e competente, esta foi exatamente o que na altura sabíamos que eles tinham potencial para oferecer: uma jarda potente de sabor poético, como uma brisa que se transforma num vendaval.
Para isso muito ajudou a presença da baterista e vocalista Stefanie Mannaerts, estrondosa força da natureza capaz de conjugar garra e destreza instrumental com uma habilidade impressionante – é coração e máquina, emoção descomunal e execução irrepreensível, tudo ao mesmo tempo. Olhamos para ela e sentimos que estamos a contemplar uma das mais talentosas instrumentistas do rock contemporâneo, para além de ser também uma autêntica role model… Porque acreditem que, numa sociedade ainda patriarcal, Stefanie é uma esplendorosa heroína e um orgulho tremendo para quem acredita que as mulheres conseguem brilhar tanto quanto os homens.
Todavia, os restantes elementos desempenham igualmente bem o seu papel, funcionando como uma reação orgânica à própria postura da sua frontwoman: por outras palavras, se Stefanie é uma infindável fonte de descarga punk, o berro que se propaga com veemência, os outros espalham uma calma melódica de natureza contemplativa, como uma frescura que ameniza a fogueira sonora. É certo que inicialmente essa dualidade até pode parecer um pouco estranha (mais em palco do que em disco, curiosamente), mas eventualmente tudo faz sentido e percebemos que se trata do yin e yang dos Brutus, o contraste coeso que lhes permite explorar esses dois extremos com o máximo de elegância. Imaginem que estão a ver os Caspian e os Refused (Stefanie e o baixista Peter Mulders chegaram mesmo a tocar numa banda de tributo aos suecos) em simultâneo, e ficam com uma ideia bastante clara da atmosfera que o trio atinge ao vivo – é raiva e calma, violência e paz, é introspeção e destruição em doses iguais de visceralidade pura.
E se o ambiente estava fantástico, tal também se deveu ao público, que nesta noite deu tudo e até mosh fez nas passagens mais agressivas – uma surpresa, de certa forma, mas que contribuiu imenso para a instalação de um entusiasmo extra. Aliás, é bem possível que até tenha motivado ainda mais a própria banda, pois estas também se alimentam dessa troca de energia que muitas vezes faz esquecer o cansaço que a vida de estrada gradualmente acumula no corpo. Seja como for, a sensação com que ficamos é de que eles já vinham preparados para dominar, o que nem é difícil tendo em conta que se encontram no seu período áureo. Enfim, pertencem a esta geração, são uma banda do agora e não uma pérola de épocas passadas que a nostalgia mantém popular. Com um setlist cuidadosamente focado no último disco, mas sem deixar de fora recordações dos álbuns anteriores, vibramos ao som de malhas como “Brave”, “What Have We Done”, “Liar” ou “Sugar Dragon”, entre outras. Nesta noite, os Brutus gritaram vitalidade num manifesto de extrema relevância que a história não esquecerá.
Já a primeira parte foi assinada pelos The Christian Club, projeto de Luca Missiaen, também oriundo da Bélgica, onde uma voz densa e negra se faz acompanhar por melodias de guitarra espaçadas , suavemente temperadas com o toque melancólico de um contrabaixo. Bem diferente de Brutus – ou então nem tanto assim, se pensarmos que os podemos interpretar como o lado calmo dos nossos anfitriões levado à exaustão-, proporcionaram uma abertura interessante, curta na duração mas com “sumo” suficiente para que os queiramos rever noutra ocasião, se possível num espaço mais intimista.
Texto: Jorge Alves
Fotografia: Miguel Silva